O ano era 1960, e o governador do Território Federal de Rondônia, coronel Paulo Nunes Leal, integrava a Caravana de Integração Nacional com destino a Brasília, saindo de Belém. Dela faziam parte os governadores do Território Federal do Acre, Roraima e dos Estados do Amapá, Amazonas, Pará, Maranhão, Mato Grosso e Goiás. Foram cinco dias vencendo toda sorte de dificuldade – atoleiros, reboque de veículos, cansaço.
Paulo Leal sonhava com uma ligação terrestre entre Rio Branco (Ac) – Porto Velho (RO) e Cuiabá (MT). O longo trecho que acabaria por ligar estas regiões ao coração do Brasil era verde, floresta amazônica, majestosa, impenetrável, totalizando mais de 1.200 quilômetros.
A Caravana da Integração apoiava a ideia de levar a proposta ao Presidente Juscelino Kubitschek, em seu último ano de governo, marcado pela execução de grandes obras, alinhavadas no programa de governo “cinquenta anos em cinco.”
Paulo Nunes Leal e os companheiros da região Norte teriam encontro com o presidente da República, a pedido dele, em 2 de fevereiro de 1960. Receberam a recomendação de não fazer pedidos a JK, não aborrece-lo.
O governador teve a cautela de primeiro se avistar com o diretor do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER), Edmundo Régis Bittencourt – engenheiro que empresta nome à importante rodovia paulista – para falar da abertura da estrada. Recebeu um balde de água fria: não havia a menor chance, pois o órgão estava endividado por causa do asfaltamento da rodovia Belo Horizonte-Brasília.
Paulo Leal conta em “O Outro Braço da Cruz,” livro que aborda a épica abertura da rodovia BR-029, hoje 364, a principal artéria de ligação do Oeste brasileiro com as regiões centro-oeste, sudeste e sul do país, ter conversado com governadores mais diretamente interessados na obra.
No dia da reunião com JK, cada governador expôs problemas de sua região, “seguindo-se as regras do jogo.” Em certo momento houve pausa, o silêncio de fim de reunião. “Senti que seria aquele o momento para tentar dizer o que pretendia, e tantas vezes ensaiara mentalmente,” conta Leal.
_Presidente, o sr. já ligou Brasília a Belém e a Porto Velho e a está ligando a Fortaleza. Por que não completa o outro braço da cruz, construindo a rodovia Brasília-Acre?
Tinha “nas mãos trêmulas” o mapa esquematizado dos diferentes trechos e quilometragens correspondentes. De novo o silencio toma conta do ambiente, quando no seu estilo bem peculiar, JK disse:
_Uai, Paulo, e pode?
_ Pode, Presidente, mas é negócio pra homem! Paulo Leal anota que um raciocínio frio não recomendaria resposta tão impulsiva. O momento ficaria marcado em sua memória.
Dando um riso aberto, JK retrucou, espalmando as mãos sobre a mesa:
_Então vai sair.
Três dias depois, a 5 de fevereiro, em ampla exposição de obras de seu governo, JK anuncia a decisão de abrir Brasília-Acre, mostrando em um mapa o percurso da futura estrada, e apontando para as ligações de Brasília a Belém, a Porto Alegre (RS) e a Fortaleza (CE), concluiu: _Desse modo ficará projetada no solo brasileiro a imagem do Cruzeiro do Sul.
Numa impressionante cruzada de abertura da estrada em menos de um ano de trabalho, empreendimento anotado pela imprensa mundial como o mais ousado no setor rodoviário até então, muitas vidas foram sacrificadas, dores e sofrimentos marcam essa épica obra.
Asfaltada somente em 1983, a BR-364 é o esteio da economia agrícola e pecuária da região oeste do Brasil e por onde transita todos os bens indispensáveis à população e ao desenvolvimento de Rondônia.