Última Hora: trincheira do nacionalismo e de Getúlio Vargas

Nacional-desenvolvimentista, Getúlio enfrentou as investidas contra um país independente e forte e modernizou o Brasil.
Getulio Vargas presidiu o Brasil entre 1930-1945 e 1951-1954. Foto: Divulgação/FGV.

No 69º aniversário de morte de Getúlio Vargas, o maior presidente de todos os tempos do Brasil, outra vez é necessário dizer que o país se transformou radicalmente para melhor com o político gaúcho no poder, por longos anos exercido. Saiu de uma configuração agrária, atrasada, com milhões de brasileiros iletrados e mal remunerados, para um patamar de industrialização, educação, cultura, saúde e institucionalização da gestão pública surpreendentes.

O Estado Novo, a partir de 37, após a tomada do poder e formação do governo provisório, em 1932, marca o início da modernização do Brasil. Com a força do Estado, Vargas garantia investimentos estatais em grandes projetos nacionais, no campo de transportes e energia, mas também incentivava investimentos privados e externos.

Nacional-desenvolvimentista, Vargas criou empresas estratégicas, vitais ao desenvolvimento, como a Companhia Siderurgica Nacional, a Companhia Vale do Rio Doce, a Companhia Hidrelétrica de São Francisco, o BNDE (hoje BNDES), a Petrobras e Eletrobras, existentes até hoje. A Superintendência da Moeda e Crédito (Sumoc), depois Banco Central, também foi criada no período. O Instituto do Café foi criado para proteger a agricultura.

A indústria vinha antes de Vargas, mas com ele o processo teve aceleração, e as riquezas do solo brasileiro só podiam ser acessadas por empresas nacionais. Incentivava a cultura popular, com intuito de florescer no país uma identidade própria, e por isso tinha crescentes admiradores.

Levado ao poder numa bem-sucedida rebelião militar, pondo fim à política de alternância do poder entre Minas Gerais e São Paulo, a chamada política café com leite, Vargas na primeira fala pública disse que os partidos e políticos não tinham ideologia, só cuidavam dos seus próprios interesses.

O jornal de Samuel Wainer era o único que apoiava Getúlio Vargas.

Passados mais de 60 anos de sua trágica morte, mais do que nunca hoje enorme parcela da população com carradas de razão concorda com a opinião de Vargas.

Por sua gestão desabrida e destemor em defender um Brasil autônomo, independente e capacitado, Getúlio Vargas encontrou conspiradores e inimigos mesmo – não adversários – em toda sua permanência no Catete.

Perante a opinião pública, a vida honrada reconhecida até mesmo por opositores, conta Lira Neto na excelente trilogia biográfica de Getúlio, foi grande trunfo para enfrentar os ataques, especialmente da União Democrática Nacional (UDN), reacionária e conservadora.

Era não apenas um partido. Era um clube de conspiração incessante não apenas contra o presidente, mas contra o Brasil, já que devotava à subserviência estrangeira a nossa condição de existir, sabotando iniciativas pró-desenvolvimento do país, contando com amplo apoio da imprensa: Correio da Manhã, Diários Associados do poderoso Assis Chateuabriand, Tribuna da imprensa, do feroz udenista Carlos Lacerda, O Globo e Diário Carioca.

O excelente jornalista Samuel Wainer entra na vida de Getúlio Vargas no final dos anos 40. É ele quem, trabalhando no jornal de Chatô, após um encontro obtido graças ao tenaz faro de repórter, na fazenda São Borja, consegue um furo: “Getúlio: Voltarei com as massas.”

O então ex-presidente, exilado em sua propriedade gaúcha, revelou ao repórter que se candidataria à Presidência da República. A esta altura havia iniciado o movimento queremista “queremos Getúlio.” Era fortíssimo candidato, e não deu outra: foi eleito democraticamente em 1950.

Wainer teve enorme compreensão do processo vivido pelo país, e no livro “Minha Razão de Viver – Memórias de um Reporter,” relata a vida humilde no bairro Bom Retiro em São Paulo, sua mudança jovem para o Rio de Janeiro e sua trajetória de jornalista na capital do Brasil, onde fundou o “Última Hora.”

Trilogia biográfica sobre todo o período de Getulio Vargas no poder de autoria do jornalista Lira Neto.

O mais importante: como cidadão compreendeu que Vargas precisava de apoio para sustentar a transformação do país politicamente, aliado ao povo, sem o que seria golpeado duramente. Assim, deixou claro ao leitor do Última Hora que o jornal defenderia os princípios e linhas de atuação nacionalista de Getúlio Vargas, mas que criticaria, sempre que necessário, os ministros de seu governo.

Travou batalhas difíceis com o principal opositor de Getúlio Vargas, Carlos Lacerda, que nutria ódio real ao jornalista filho de migrantes judeus. Por essa condição judia, Wainer foi perseguido e sofreu duro processo judicial capitaneado por Lacerda e Chato.

Wainer inovou no jornalismo brasileiro. Fez um jornal popular, criativo, com profissionais excelentes, inaugurou colunas como “A Vida como ela é,” de Nelson Rodrigues, e “O Dia do Presidente,” tendo destacado um repórter de sua confiança para cobrir o gabinete de Getúlio no Catete diariamente. Essa coluna era sucesso absoluto. O jornal vendia como água.

Os jornais se recusavam a dar notícias dos passos do governo Getúlio Vargas. Com a iniciativa de Wainer, tiveram que correr atras, e não foram poucas as investidas feitas pelas famílias endinheiradas da imprensa brasileira – assim até hoje – para fechar o Última Hora. Uma intenção que não vinha apenas do setor, mas também do meio político.

Próximo ao fatídico 24 de agosto, Wainer recebeu emissário do presidente Vargas, àquela altura duramente golpeado por causa da descoberta de que seu chefe da guarda pessoal, Gregório Fortunato, estava envolvido no atentado da rua Tonelero que envolveu Lacerda e a morte de oficial da Aeronáutica.

Maneco, o emissário filho do presidente Vargas, disse que em reunião ministerial naquele dia (22) o chefe da nação falou que do Catete só sairia morto. Vargas pediu para indagar a Wainer se ele publicaria manchete com a frase, uma cifrada mensagem de resistência. O jornalista não se opôs, mas alertou que poderia desencadear um confronto entre forças a favor e contra Vargas, exatamente o que pretendia o hábil e enigmático político.

GETULIO AO POVO: SÓ MORTO SAIREI DO CATETE estampou o Última Hora com a célebre foto de Getúlio Vargas com as mãos sujas de petróleo na edição do dia 23. Durante todo o dia o povo do Rio de Janeiro comprou o jornal de Wainer, que em sucessivas edições contava os momentos finais do governo.

Depois, Wainer imaginou um golpe ou renúncia a caminho. Recebeu, após passar a noite em claro, o telefonema do plantonista do jornal com a notícia da morte de Vargas. Tinha guardado a pagina composta em chumbo com a capa anterior. Lá em cima escreveu: “ELE CUMPRIU A PROMESSA.” Abaixo, a frase em que prevenira que não o tirariam com vida do Palácio do Catete.

Todos os jornais que hostilizavam Getúlio, tripudiavam as ações favoráveis ao povo e atuavam contra o trabalhismo e nacionalismo foram invadidos por uma turba exasperada, que os julgavam culpados pelo trágico gesto presidencial.

Getúlio é único na história política do Brasil. Um estadista de verdade.

Fake existe aos montes, inclusive um que no twitter em 2018 publicou ser “a encarnação de um pedacinho de célula de cada um de nós.” Da minha, seguramente não.