Pilar da democracia, transparência no governo Lula resvala no deboche

Negacionismo na transparência começou na posse de Lula; MEC engaveta, de forma inédita, dados do Saeb e auditoria do TCU revela que existe maior preocupação em controlar dados do que transparência nas informações.
Governo de Lula engaveta dados do 2º ano do Saeb, algo inédito no país. Foto: Ricardo Stuckert.

A transparência é um dos pilares da democracia. A publicidade dos atos de governo, inscrita no artigo 37 da Constituição Federal como um dos princípios da administração pública, é uma exigência que reiteradamente é descumprida pelo governo Lula 3.

A prática negacionista começou antes mesmo do presidente sentar-se na cadeira. A lista de 3500 convidados para o regabofe da posse simplesmente foi negada à imprensa. Não fosse a gritaria, o Itamaraty não a teria liberado. O argumento? Privacidade dos convidados!

E olhem que durante a campanha, prometer cumprimento da Lei de Acesso à Informação (LAI), Portal da Transparência atualizado e retirar sigilos que o antecessor havia colocado por exemplo em gastos de cartão corporativo foi compromisso estridente, para ao fim e ao cabo a transparência resvalar para o deboche.

Sim, porque está comprovado à farta que o desregramento das despesas do casal presidencial é vultoso, não se usa tênis por menos de dez mil reais ou gravata por menos de mil reais, as viagens internacionais são caríssimas, e nós brasileiros, tudo parece, pagamos a conta de gastos pessoais.

E não se divulga os gastos do cartão corporativo, que não se presta a esse tipo de coisa, mas há brechas para despesas sigilosas. E a vida de bon-vivant segue plena nessa condição oculta, favorecendo abusos e privilégios.

Como se sabe, o sigilo de 100 anos para informações da primeira-dama Rosangela, a Janja, e para o ministro Alexandre da Silva (Minas e Energia), foram algumas práticas da negação da transparência. Tem (muitas) outras: sigilo nas visitas dos filhos do presidente; no uso do helicóptero presidencial e negação de pedidos de informação feitos pela imprensa via LAI que superaram em número o tão criticado antecessor Jair Bolsonaro.

Agora, por excelência do trabalho dos jornalistas Paulo Saldanha e João Gabriel, do jornal Folha de São Paulo, nos deparamos com a seguinte manchete da matéria publicada no dia 27 de março: “Governo Lula barra divulgação de dados de alfabetização da principal avaliação do país.”

Diz a abertura da notícia:O governo Lula (PT) vai engavetar a divulgação dos resultados de alfabetização da principal avaliação da qualidade da educação básica do país. O MEC (Ministério da Educação) já havia escondido os dados no ano passado, mas prometia divulga-los. Agora, excluir essas informações é uma decisão. Esses dados de alfabetização são da última edição, de 2023, do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica). O Saeb contempla as provas de português e matemática que compõem o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica).”

A Folha revela que obteve um ofício assinado pelo presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos Educacionais, órgão do MEC responsável por avaliações), Manuel Palácios, indicando que haja somente a “publicação dos microdados das avaliações do Saeb 2023 do 5º e 9º ano do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino médio de Língua Portuguesa e Matemática”.

O ministério de Camilo Santana resolveu esconder dados relativos ao Saeb do 2º ano, de provas feitas por crianças de 7 ou 8 anos, que avaliam níveis de alfabetização e são aplicadas por amostras de escolas em todo o país. Mede o desempenho por Estado. Nas outras series, todas as escolas participam.

Por que negar a divulgação de dados que já haviam sido sonegados e prometida divulgação posterior?

A decisão de ocultar dados de uma avaliação já aplicada é inédita no país, apuraram os repórteres da Folha, mas não ganhou, adivinhem, um milésimo sequer de protesto que ganhou a omissão de casos e atrasos nos boletins da Covid na gestão do ex-ministro Pazzuelo. Nem mesmo de entidades vinculadas à educação.

A Folha revela que segundo técnicos do Inep o “principal motivo para o engavetamento seria o fato de que há diferenças entre os resultados do Saeb e de outro instrumento criado pelo atual governo para mensurar a qualidade da alfabetização —divulgado com pompa no ano passado pelo ministro da Educação, Camilo Santana.”

Evidente que se trata de desculpa esfarrapada, que só serve à especulação de motivação política, levando a Folha a publicar no dia seguinte editorial intitulado Decisão do MEC de não divulgar dados é indefensável.

“Um governo que não publica dados produzidos por seus órgãos de pesquisa não só infringe o princípio da transparência, que deve reger a administração pública, como cria desconfiança na sociedade, que passa a cogitar motivação política para tal omissão,” disse o jornal.

Não surpreende. No governo Lula 3 é ampla a demonstração de negacionismo na transparência. Por tudo que a imprensa tem divulgado, parece que se orienta como se fosse fim de “festa” – talvez se dê conta de que não haverá 2026 -, numa gastança desenfreada sem prestar contas do nosso dinheiro, a primeira-dama diz que coloca a agenda no Instagram – olha o deboche! -, e até prega o sigilo fora do seu comando.

Após uma votação em que o ministro Cristiano Zanin levou “surra” da hipócrita militância da esquerda, Lula, em setembro de 2023, quando o governo já acumulava inúmeros casos de ausência de transparência, defendeu que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) proferissem votos sem revelá-los.

“Eu acho que os caras têm que votar e ninguém precisa saber,” disse. Justificou a escuridão da toga com o intento de “controlar animosidades” contra as instituições brasileiras. O nome disso é censura. Sabemos bem a que propósito serve.

Que democrata!

O negacionismo na transparência foi constatado por recente auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), divulgada em 14 de março. Um apontamento diz: “Normas e orientações possuem maior ênfase em proteção de dados do que em transparência das informações e não tratam dos temas de forma integrada.”

Constatou o Tribunal: “Órgãos públicos e servidores indevidamente removem ou não mantêm atualizadas informações essenciais para a transparência ativa, a exemplo dos microdados do censo escolar e dados consolidados de desempenho do Exame Nacional do Ensino Médio por escola e por unidade da federação. Opa, olha a educação aí de novo.

Para o TCU, a retirada unilateral dessas informações, sob alegação genérica de conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), “tem causado interrupções em serviços oferecidos pela sociedade civil, diminuindo a transparência e o controle social.”

Com essa breve descrição da auditoria, se afirma claramente a gênese de controle e censura, marcas desde sempre do PT.  Quem sabe seja tema para outro Contraponto.