Apagão no orçamento federal em 2027: uma crise anunciada

Previsão é de que cairá de R$ 208 bi em 2026 para R$ 122,2 bi em 2027 os recursos livres para o governo tocar investimentos e custeio da máquina. Colapso admitido agora pelo governo foi antecipado por estudo da Câmara no começo do ano.
Esplanada dos Ministérios em Brasília: risco de colapso em 2027. Foto: Joédson Alves/ABr.

Bons economistas, descomprometidos com o sistema financeiro, técnicos sérios e políticos em minoria escassa vem alertando desde o ano passado para o governo federal cumprir a tarefa de equilibrar as contas, do contrário o Executivo chegará em  2027 sem dinheiro para pagar salários e comprar o cafezinho na Esplanada dos Ministérios. E o mais grave: correndo risco severo de paralisar serviços à população.

As despesas sobem mais do que as receitas, e até agora as medidas pontuais – a maior parte no sentido de fazer pente-fino em políticas vultosas, como o Bolsa Família – não atingiram esse propósito, ignorado pelo presidente da República, um negacionista da casa arrumada, da saúde fiscal do Estado, como ele próprio não se cansa de repetir.

Não há na sua verve falante, nenhum apelo, constante, firme, sistemático, para que a proposta de restringir supersalários com o enquadramento do que pode ser exceção ao teto remuneratório nacional avance, por exemplo. Ajudaria a constranger e pressionar o Congresso e todos os atores como o Judiciário que vivem em outra dimensão, gastando a rodo dinheiro dos nossos impostos.

Esse enfrentamento tem de ser feito, o que não ocorrerá com governos populistas como o de Lula. O tema supersalários é questão inclusive colocada entre as medidas anunciadas em novembro de 2024 pela Fazenda, quando se detalhou o pacote fiscal e revisão de gastos que afetaram ainda a correção do salário mínimo, investimentos em cultura (lei Aldir Blanc) e mudanças nas regras do Benefício de Prestação Continuada (BPC) entre outras medidas implementadas rapidamente. Em um dos slides divulgado para a imprensa consta que “o Brasil vai bem.”

No dia 15, terça-feira, a conversa é outra. O governo admitiu o colapso das contas públicas em 2027 durante anúncio de envio do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026 para o Congresso Nacional, legalmente previsto para abril, e quando ingênuos de plantão consideravam que novas medidas fossem encaminhadas no projeto, o que não ocorreu.

O PLDO é o lugar apropriado para se definir um ajuste, afinal é a proposta que estabelece as regras gerais do Orçamento, e meta de equilíbrio entre receitas e despesas que o Executivo precisa perseguir.  O governo não enfrentou o drama, deixando por exemplo as dívidas judiciais, os chamados precatórios, fora da revisão de gastos.

E não se vê única movimentação no Congresso Nacional por parte das lideranças de Governo e da ministra de Articulação Política para que os parlamentares arregacem as mangas e comecem a debater e votar propostas estruturais que interessem ao país.

Em português bem claro: o cenário de 2027, seja quem for o novo presidente, prevê o governo sem dinheiro suficiente para manter investimentos e a máquina funcionando minimamente. PAC? Se hoje está empacado, anda a depender de emendas parlamentares, imagine em 2027.

O governo fez as contas e declarou que o espaço para as despesas não obrigatórias (discricionárias, livres), que são usadas para investimentos públicos, parte da educação e saúde, custeio da máquina e com o agravante do avanço acelerado de emendas será de R$ 208,3 bilhões em 2026, caindo para 122,2 bilhões em 2027, R$ 59,5 bilhões em 2028 e R$ 8,9 bilhões em 2029 se tudo continuar do jeito que está.

Essa conta dois consultores da Câmara dos Deputados fizeram em fevereiro, quando divulgaram o  estudo “Projeções fiscais e orçamentárias: o desafio das despesas discricionárias.”  Dayson Pereira de Almeida e Paulo Bijos anunciaram o colapso de 2027, e sugeriram na ocasião que neste mês de abril o PLDO fosse encaminhado com alternativas de ordem estrutural para evitar a crise.

“Antevê-se cenário crítico de achatamento do espaço discricionário no orçamento federal, cuja reversão dependerá de medidas estruturais capazes de moderar o ritmo de crescimento do gasto público nos próximos anos, sobretudo no campo das despesas obrigatórias,” diz trecho do estudo.

Eles observaram que como há limite no arcabouço fiscal para as despesas primárias  – todos os gastos com políticas públicas e manutenção, à exceção do pagamento de juros – o caminho para controle das contas é pela redução das despesas, e não aumento das receitas, como tem priorizado o governo Lula 3.

“Aumentos de receita, afinal, não têm o condão de criar espaço fiscal no curto prazo, tendo em vista o que limite de despesa é fixo,” disseram.

Técnicos do governo tem a noção do buraco nas contas do governo, mas o chefe do Executivo empurra sempre em sintonia com o ministro da Fazenda a solução definitiva para o equilíbrio, que passa por ajustes estruturais. Até o momento, apenas as camadas mais pobres e vulneráveis da população e trabalhadores – abono salarial também foi alterado – foram atingidos pelos pontuais ajustes de novembro.

O secretário de Orçamento Federal, Clayton Luiz Montes, durante a coletiva de imprensa para anunciar o projeto da LDO, admitiu o colapso e disse que o comprometimento das finanças existe mas nas projeções do Ministério do Planejamento esse comprometimento não foi endereçado.

Anunciou que novas medidas serão discutidas no encaminhando do PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual), somente em agosto. Reduzir ministérios, convocar poderes para apertar cintos, andar com propostas estruturantes e rever a política de juros, que encarece o refinanciamento da dívida pública brasileira, fixado no orçamento de 2025 em mais de R$ 1 trilhão, nem pensar.

Dá trabalho, requer disposição e conhecimento por parte do maestro. E não combina com apelos para a próxima eleição, que tem de ser na base de algo parecido com o mote picanha e cerveja. Haverá quem caia no papo outra vez.