A gangorra do STF:  Por 7 votos a 4, foro privilegiado para políticos é ampliado

André Mendonça é um dos quatro votos contra a mudança do que foi decidido em 2018 sobre foro privilegiado; a incoerencia de Barroso é espantosa.
Mendonça defendeu posição da Corte de 2018: compromisso com a sociedade justa e solidária. Foto: Gustavo Moreno.

O Supremo Tribunal Federal (STF), por 7 votos a 4, decidiu ampliar o foro privilegiado para alcançar políticos que estão sem mandato, mas no entanto cometeram crimes no exercício do cargo que ocuparam e em função dele.  A decisão altera o que havia sido deliberado em 2018, ou seja, há 7 anos apenas.

Essa nova posição resulta da apreciação do HC 232627, apresentado pelo senador Zequinha Marinho (PA), cujo julgamento foi iniciado em março de 2024.  O julgamento, em plenário virtual, foi concluído nesta terça-feira,11.

O caso foi  interrompido três vezes por pedidos de vistas (mais tempo para análise). A maioria já estava formada em setembro de 2024, quando Kassio Nunes Marques  pediu novo prazo para formular seu posicionamento. Essa mudança afeta processos que envolvem ex-ministros, como Anderson Torres e Braga Netto, que devem ter julgamento realizado pela Corte, e também o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Em 2018, em razão de posição decisiva do relator de então, ministro Luís Roberto Barroso, em outra ação, os ministros votaram para que ficassem na Corte apenas processos de parlamentares que tivessem cometido algum crime no exercício do cargo e nele estivessem. Aqueles que renunciassem, deixassem o mandato ou não fossem reeleitos não seriam mais julgados no STF.

Com o encerramento de competências do Supremo no julgamento de casos de parlamentares que encerravam o mandato e também no julgamento de casos em que os crimes não tinham relação com o mandato ou foram cometidos antes da assunção do cargo o STF revelou que 80% do tempo com análise processual foram economizados.

No ano passado, ao julgar em março no plenário virtual o HC 232627, o relator, ministro Gilmar Mendes, abriu a gangorra a que o STF tem se dedicado nos últimos tempos. Mudou a decisão para o que era antes de 2018.

Gilmar Mendes disse na ocasião que a ampliação do alcance não muda “a essência” do que foi decidido pelo STF em 2018.

Apenas “avança para firmar o foro especial mesmo após a cessação das funções.” O alcance agora revisto por ele abrange também parlamentares que tenham renunciado, sido cassados ou não reeleitos.

Incoerente com seu relato de 2018, Luís Roberto Barroso seguiu Mendes. Os demais que o seguiram foram Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Nunes Marques e Dias Toffoli.

O julgamento no plenário virtual continuou, e em abril de 2024 o ministro André Mendonça pediu vista do processo, devolvendo no final de fevereiro deste ano. O ministro deixou seu voto no sistema, mencionando a posição do relator Barroso em 2018 que, é digno de nota, é parte da gangorra jurídica patrocinada pela Corte que agora preside, contribuindo aceleradamente para moldá-la sem afirmação institucional e respeitável que outrotra a mais alta instância judicial do país se notabilizava.

Anotou Mendonça: “Naquela oportunidade, restou definido que o “foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas.”

“Trata-se de entendimento congruente com os valores republicanos contemporâneos e com os princípios do juiz natural, da isonomia e da igualdade. Ainda, se revela aderente ao compromisso de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, na qual todos são iguais perante a lei,” sublinhou no voto.

É um voto que harmoniza com posições de Mendonça em vários casos na Corte, um deles tratando por exemplo de inquérito conduzido por Alexandre de Moraes em que ele é parte, tendo o ministro escolhido por Bolsonaro votado para que a relatoria não ficasse sob a competência de Moraes.

Além de Mendonça, votaram contra a gangorra jurídica do foro privilegiado que de fato é uma aberração que destoa do princípio republicano da igualdade, a ministra Carmem Lúcia, o ministro Edson Fachin e Luiz Fux.

Voto de Mendonça abaixo:

Voto Andre Mendonça Foro Privilegiado