Afastado do cargo, desembargador acusa juíza do DF de crime em ação milionária

Reimão: contrato de quase 12 milhões de reais com a advogada Lua Reimão Lopes em ação popular controversa.
Desembargador Evandro Reimão, afastado das funções. Foto: Reprodução TRF-6.

Afastado por unanimidade do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por morosidade e assédio moral aos servidores de seu gabinete no último dia 16, o desembargador Evandro Reimão dos Reis está envolvido em outro caso no qual atua a magistrada Diana Maria Wanderlei da Silva, do Distrito Federal.

No dia 1º de agosto do ano passado, antes da correição realizada no gabinete de Reimão na sede do TRF-6 (Minas Gerais), a magistrada pediu ao corregedor nacional de Justiça, ministro Luiz Felipe Salomão, que avaliasse a conduta do desembargador no âmbito de uma ação popular que ele move contra pessoas que reivindicam indenização por uso de terras da União exploradas por extensos seringais em Cruzeiro do Sul(AC), tentando desqualificar memoriais descritivos elaborados por órgãos públicos federais. É uma indenização em torno de R$ 150 milhões.

Segundo a juíza Diana, ele pediu a devolução das terras devolutas à União, e cobra dos réus o pagamento de todos os custos do processo que patrocina, como viagens, hospedagens, gastos em cartório, perícias, copias de documentos, incluindo honorários contratuais de R$ 11 milhões e 900 mil que celebrou com sua advogada Lua Reimão Teles e Lopes. Ele alega ser uma causa complexa quando descreve o valor no contrato.

Como não obteve sucesso na ação popular, o desembargador, no decorrer do processo, segundo a juíza Diana Wanderlei, tentou sua substituição invocando suspeições, e apresentou queixa-crime contra ela. A juíza elaborou o documento Razões de Exceção de Suspeição dirigido ao desembargador presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

É no final deste documento que pede sob “perspectiva própria” uma avaliação do corregedor nacional de Justiça se Evandro Reimão incidiu em conduta a ferir os ditames do Código de Ética da Magistratura e demais deveres funcionais.

“Infelizmente, por via obliqua, o autor almeja, em uma série de condutas supervenientes à prolação da sentença, atingir a reputação moral desta magistrada, inclusive com afirmações caluniosas e ofensivas, para que o juízo natural não seja plenamente exercido, já que a sentença não firmou tese a favor da sua pretensão,” relata a juíza.

Evandro Reimão teria acusado a juíza de cometer o crime de ocultação de documento, o que a magistrada demonstra ser inverdade. Diana explica ter cometido o equívoco de assinar eletronicamente um despacho em lugar indevido, “decorrente de impulso de despacho processual,” movimentação que ela pediu longo para ser cancelada antes das partes serem intimadas.

“O PJE (Processo Judicial Eletrônico) permite o cancelamento de meros despachos antes de intimação,” disse a juíza, acrescentando: “O autor afirma que o dolo desta magistrada para justificar o crime que imputa foi o ‘velado propósito de constranger o Representante como Desembargador Federal pelo insucesso da demanda’, por ter sentenciado pela extinção da demanda, e não lhe conferindo a vitória da pretensão, como gostaria.”

A juíza Diana Wanderlei anota grande preocupação do desembargador em incluir nas petições apresentadas ao longo do processo a qualificação do cargo que ocupa. “A qualificação da profissão é apenas exigida na petição inicial. Contudo, em todas as petições que o cidadão da ação popular atravessa, ao lado do seu nome, há a denominação da sua profissão de ‘Juiz Federal’ e, após a sua promoção ao TRF6, a de ‘Desembargador Federal’, sempre em letras maiúsculas iniciais,” destaca.

“O único e exclusivamente legitimado da ação popular é o “CIDADÃO”, independente da sua profissão!” sublinha a juíza.

A juíza Diana da Silva disse também que “não raras vezes” o autor da ação popular se manifesta no processo “utilizando de formas rudes no trato.” Relata, ainda, indícios de tom intimidador e autoritário ao longo do processo, sempre que é desagradado, inclusive com os servidores do judiciário.

A juíza Diana Wanderlei registrou ainda que o autor da ação popular tentou interferir nos procedimentos de prazos e aditamentos do processo, e que tão logo teve a sua pretensão não acolhida quanto à procedência da ação, “ao invés de recorrer às instâncias superiores, valeu-se de conduta ofensiva ao decoro desta magistrada, imputando práticas de delito, onde sabidamente não as têm, fora diversas ofensas, em total desrespeito a qualquer norma de eticidade e respeito dentro dos padrões de civilidade que norteia a atividade dos operadores de Direito.”

 A correição feita pelo CNJ no gabinete de Evandro Reimão ocorreu no final do mês de agosto, mas no voto no qual o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Conselho Nacional de Justiça determina a abertura de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra Reimão não há menção às alegações da juíza Diana Wanderlei.

Quando a correição foi realizada Evandro Reimão estava em Salvador, e alegou submeter-se a uma cirurgia para não participar do trabalho da equipe do CNJ. A equipe teve a informação de que ele mora na capital baiana e não em Belo Horizonte, o que deverá ser investigado.

Chamou a atenção da correição o expressivo número de vistas em processos formulados pelo desembargador afastado, sem devolução para conclusão do julgamento. De acordo com o portal Em Cima da Hora, a correição no gabinete identificou quantidade elevada de acórdãos pendentes e adiamentos de julgamentos. No dia da inspeção, 663 acórdãos aguardavam assinatura de Reimão, referentes a julgamentos ocorridos nos sete meses anteriores.

Servidores relataram comportamento “explosivo” e tratamento grosseiro por parte de Reimão, que os obrigava a trabalhar até tarde da noite.

O relator, ministro Luiz Felipe Salomão, disse que a equipe designada para os trabalhos de correição, a partir da análise de processos, constatou séria deficiência na gestão do acervo da unidade, tal como morosidade excessiva na condução dos feitos.

“Somado àquela deficiência, constatou-se conduta repreensível do magistrado, no que diz respeito à forma de tratamento de servidores lotados no gabinete, assim como o relacionamento com outros desembargadores do Tribunal a que pertence, circunstâncias devidamente expostas no relatório da correição,” diz o ministro.

Relato juiza Diana Wanderlei