No interrogatório à Primeira Turma no Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Jair Bolsonaro admitiu ao ministro Alexandre de Moraes ter cogitado decretar estado de sítio “em grande parte por causa do TSE,” mas a questão discutida não foi adiante.
A afirmação foi feita ao ser perguntado pelo relator sobre a reunião ocorrida em dezembro de 2022 com o ministro da Defesa Paulo Sergio Nogueira e comandantes das Forças Armadas.
Bolsonaro disse que no encontro foram tratados vários assuntos, como a GLO, a paralisação de caminhoneiros e os acampamentos. “Estudamos possibilidades outras dentro da Constituição Federal; jamais saímos das quatro linhas. Abandonamos qualquer possibilidade de uma ação constitucional, e enfrentamos aí o ocaso do nosso governo,” declarou.
O ex-presidente disse que após o PL ter peticionado a Justiça Eleitoral para rever a votação em segundo turno por entender a existência de “vulnerabilidades” no processo eleitoral, o partido teria sido surpreendido com multa de R$ 22 milhões.
“A multa nos abalou, e faz falta esse dinheiro. Nós decidimos então encerrar qualquer discussão sobre o resultado das eleições, que no passado sempre foi feita com muita constância por outros partidos,” disse Bolsonaro. Ele citou Leonel Brizola, Aldo Rebelo e por fim o ministro Flávio Dino como pessoas públicas que já se manifestaram pelo voto impresso e questionaram a aventada inviolabilidade do sistema eletrônico de votação.
À pergunta do relator, ministro Moraes, se recebeu o então assessor Felipe Martins para tratar de uma minuta para possível golpe, Bolsonaro disse que não conversou com ele sobre minuta alguma. “Quando o senhor fala em minuta dá a entender em minuta do mal, da conspiração. Refuto qualquer ideia que não esteja enquadrada dentro da Constituição Federal.”
Sobre a fala de Mauro Cid, delator nas investigações, de que Bolsonaro teria “enxugado” texto da minuta de golpe, o ex-presidente confirmou que se encontrou com ele em momento em que estava Felipe Martins e um padre presente, mas disse que “não procede o enxugamento.”
“Eu queria ter acesso a essa minuta,” disse. “Estão nos autos,” respondeu o relator.
“Mas não tem o cabeçalho nem o desfecho. Foi colocado na televisão rapidamente. Mas chegou sem força. A ideia de alguns era estado de sitio, tem que ter um fato e depois convocar os Conselhos da Defesa e da República, e isso não foi feito. Alguns falam que foi dado o início, o início é a convocação dos Conselhos,” declarou. O estado de sítio dá mais poder ao Executivo, suspendendo temporariamente os poderes Legislativo e Judiciário.
Bolsonaro disse ainda que os presidentes do Senado e da Câmara, líderes das duas Casas e ministros teriam de ser convocados a participar de uma proposta de estado de sitio e isso não ocorreu. “E vamos supor que faria. Tinha de encaminhar ao Congresso para autorizar o decreto.”
O ex-presidente disse também que nos dois últimos meses de mandato agiu sem estimular ou incentivar manifestantes que nem ao menos sabiam o que é o AI-5 a fazer manifestação ou acampar em frente aos quartéis, preferindo se recolher. Ele também criticou as penas que julgou elevadas para os manifestantes que promoveram quebra-quebra nos prédios dos poderes.
Bolsonaro responde pelos crimes de golpe de Estado e tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito. Ele também responde pelos crimes de organização criminosa armada, dano qualificado pelo emprego de violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado. As penas, se somadas, superam 30 anos de cadeia.