Descaso do governo com a mineração gera R$ 16,4 bilhões em sonegação

Em ano eleitoral, a gastança para lustrar a imagem do governo Lula pode superar R$ 600 milhões, enquanto o orçamento da Agencia Nacional de MIneração(ANM) é de R$ 370 milhões.   
Greve em 2023: quadro de pessoal da ANM é o menor em 8 anos de existencia. Foto: Divulgação/ASANM.

Nos últimos 8 anos, o Estado brasileiro deixou de arrecadar R$ 16,4 bilhões em impostos de mineração por causa da negligência do governo federal que falha na fiscalização e cobrança de impostos do setor. O número foi divulgado há dois dias pelo Tribunal de Contas da União (TCU),mas pode ser até maior.  

Esse descaso é bem antigo, mas o TCU se debruçou em auditoria no período de existência da Agência Nacional de Mineração (ANM), vinculada ao Ministério de Minas e Energia, legalizada em dezembro de 2017 em substituição ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

A ironia é que a ANM surgiu justamente para ter autonomia orçamentária, independência funcional e administrativa, começou a ser discutida no segundo governo Lula, mas vive no expediente da lentidão, burocracia, legislação conflitante, mendicância por verbas e falta de pessoal desde aquele ano complicado do pós-impeachment de Dilma Rousseff (PT), cercada por lobbies e conchavos perpetrados por mineradores.

Os desastres de Mariana, Brumadinho, garimpo ilegal frequente no noticiário e a sonegação de sempre junto com o descaso relatado acima na estruturação da ANM aponta para a perversidade exponencial presente em todos os governos desde que a entidade surgiu: ausência de política mineral no Brasil.

De Lula a Dilma, de Temer a Bolsonaro e de Lula de novo algo mais está além da sonegação apontada pelo TCU, que em sua auditoria constatou a falta da política que poderia alavancar e ampliar a participação do setor no PIB. A ausência resulta em projeto de destruição das potencialidades do país, de negar ao povo brasileiro acesso aos recursos auferidos por um bem que é da União, de todos.

A sequência de governos corruptos, negligentes, ineficientes e omissos sonega da sociedade profundamente desigual a possibilidade de melhorar o atendimento à segurança, saúde  e educação.

A perversidade que a política mineral inexistente acarreta faz com que a ANM siga fazendo de conta que fiscaliza mineradoras, analise processos de lavra e outras atriuições e a riqueza mineral que é finita e diversificada neste pais abençoado – por isso mesmo cabe também amaldiçoado – não gera renda para a população, como o petróleo. Tal como este, o bem mineral é bem público.

Segundo o TCU, quase 70% dos mais de 30 mil processos ativos de mineração não pagaram espontaneamente a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem) entre 2017 e 2022, contribuição que o governo Lula deveria repassar para a ANM, mas não o faz.

Além disso, de 134 processos fiscalizados pela autarquia, apenas 40% pagaram o tributo devido, feito por autodeclaração das mineradoras.

Autodeclaração! Por isso o ministro relator Benjamin Zymer disse que a arrecadação da mineração depende essencialmente da boa-fé das empresas.

“Porém, não existem instrumentos para persuadi-los, uma vez que a estrutura fiscalizatória da ANM é incapaz de gerar a expectativa de controle no setor regulado e, mesmo após as poucas fiscalizações, não se logra efetividade na cobrança”, disse em relatório.

Dos R$ 16,4 bilhões sonegados, a auditoria estima que até R$ 12,4 bilhões deixaram de ser arrecadados entre 2014 e 2021. Além disso, outros R$ 4 bilhões de receita potencial deixaram de ser arrecadados por créditos prescritos entre 2017 e 2021.

Aconteceu porque a ANM não adotou as providências previstas para a cobrança dos valores. Correm também o risco de serem prescritos outros R$ 20 bilhões no atual governo.

O déficit primário previsto para este ano no orçamento federal é de R$ 28,3 bilhões.  O valor sonegado pelo setor mineral representa, sozinho, 55% desse montante. Porém, aumentar a arrecadação mediante combate à sonegação não faz parte dos planos de Lula e Fernando Haddad. Se fizesse, não deixariam a ANM, com quase década de vida, passar pelo que está passando.

Seu empenho, desde o início do governo, é criar impostos ou realinhar existentes. Em outra ponta, acabar a vinculação orçamentária dos recursos da saúde e educação – para os apaixonados, sugiro consultar declarações da equipe da Fazenda desde o 1º semestre do ano passado – e cortar gastos que atingirão o bolso do trabalhador estão na agenda.

“A ANM continua com sistemas defasados, sem a devida integração e sem os requisitos mínimos de infraestrutura, o que ocasiona erros frequentes. Não há pessoas para analisar os processos e não há dinheiro para melhoria dos sistemas”, afirma Samanta Cruz, vice-presidente da Associação dos Servidores da ANM.

Na entrevista à Folha de São Paulo, em abril deste ano, ela disse também que mesmo com a explosão de garimpos ilegais registrada no governo anterior a ANM não tem estrutura dedicada para lidar com garimpos, “e nenhum investimento foi feito pelo governo federal para estruturar a área, a exemplo da aquisição de equipamentos, concurso, treinamento específico para áreas ilegais junto com polícia, ou outra ação efetiva.”

Abandonada, nesta mesma reportagem a ANM calcula que, entre impostos sonegados, processos prescritos e investimentos represados, a União deixou de arrecadar R$ 153 bilhões nos últimos cinco anos. É um valor quase 10 vezes maior do que o detectado pelo TCU.

No setor de pessoal, tudo piora no governo Lula. Quando houve o desastre de Mariana, em 2015, havia 949 servidores ativos; em 2019, ano do rompimento de Brumadinho, eram 755 e agora, 2024, são 663, uma queda de 30%, o menor patamar da história.  Boa parte do quadro é de servidores emprestados.

Com um orçamento que já foi de R$ 541 milhões depois da tragedia de Mariana, de 2019 em diante a verba da ANM só cai. O orçamento de 2024 é de R$ 370 milhões, enquanto a publicidade oficial do governo Lula teve R$ 359 milhões em 2023!

Este ano eleitoral a gastança criminosa para lustrar a imagem do populista governo do PT pode superar R$ 600 milhões.

O governo eficiente para elevar gastos em áreas não prioritárias é incapaz de acertar o passo de um setor que contribui com 4% do Produto Interno Bruto do Brasil, com faturamento de R$ 250 bilhões registrado em 2023.

O TCU cobrou do governo federal um plano de ação para desenvolver um sistema de arrecadação e cobrança dos tributos da mineração com intuito de reduzir a sonegação no setor. Vai cumprir?  É cravar um sonoro não.

Em outubro do ano passado, o STF deu 6 meses de prazo para o governo identitário apresentar um plano para solucionar a superlotação de detentos no Brasil. Até agora, 1 ano depois, ninguém sabe ninguém viu. A mesma Corte deu prazo para fazer um plano de combate os incêndios no Pantanal e Amazonia. Tomado pelo fogo, o Brasil descobriu não haver plano algum.

A renitente fragilidade operacional da ANM só alegra os que atuam na ilegalidade, e os que dentro do poder público torcem pelo quanto pior melhor, pois também ganham com i$$o.

Com o exposto, fica a certeza inabalável de que a crise no setor mineral, do mesmo modo como a da educação, não é uma crise. É projeto, bem-dito pelo ilustre Darcy Ribeiro.

Pobre Brasil.