Equipe de Lula quer rever sigilo de 100 anos imposto por Bolsonaro. E o de Dilma?

Bolsonaro colocou como sigilo diversos atos, como o processo administrativo que envolve a PRF na morte do cidadão Genivaldo de Jesus.
Jair Bolsonaro, segundo o hacker, teria falado com ele ao telefone. Foto: Fabio Pozzebom.

Leio no jornal “O Estado de São Paulo” que a equipe de transição de Lula estuda rever o sigilo de 100 anos imposto em relação a algumas decisões do governo Jair Bolsonaro, uma das ações em discussão para a área da transparência. Precisa mesmo. Fundamental. Negar acesso por 100 anos aos procedimentos administrativos dos agentes envolvidos na morte de Genivaldo de Jesus por agentes da PRF ou os dados de crachás e entradas de Carlos Bolsonaro, vereador no Rio de Janeiro, ao Palácio do Planalto, merecem questionamentos.

Agora, inicialmente, é preciso esclarecer o que a matéria não diz. O sigilo é previsto desde 2011, quando a então presidente petista Dilma Rousseff sancionou a Lei de Acesso à Informação (LAI), norma que classifica três tipos de categoria para determinar o tempo de sigilo. O crucial é ver se há abusos no uso do sigilo secular, exceção nessa classificação.

O texto do jornal diz: “Até o momento, um dos pontos que mais deu (sic) trabalho foi a definição de como tratar o chamado sigilo de 100 anos nos casos em que o governo Bolsonaro se recusou a fornecer informações como a carteira de vacinação do presidente da República ou o processo administrativo aberto pelo Exército para apurar a participação do general Eduardo Pazuello num ato político, sem autorização do comando da Força.”

Dilma impos também sigilo de 100 anos em alguns atos. Foto: Cleia Viana/CD.

Realmente, não é fácil, especialmente se o presidente eleito apto a “negociar na mesa de bar” não quer briga com generais, ainda mais eleito senador. Nas entrelinhas, um dos pontos que mais deram trabalho, em verdade, não está circunscrito a definir o que merece de fato sigilo eterno ou por século de tempo, o que suscita sem dúvida questionamentos, mas também porque Dilma usou do recurso. Irão reformar suas decisões também?

De novo o jornal poderia ter contextualizado as informações, como foi o site O Poder, que em matéria cujo título é “Como funcionam os sigilos de 100 anos impostos por Bolsonaro,” publicada em 3 de setembro do corrente, aponta os casos em que a petista também recorreu ao uso do instrumento.

Dois exemplos, lembra o Poder360: Dilma pediu o sigilo por 100 anos dos emails do funcionário da Presidência Jorge Rodrigo Messias, que ficou conhecido como “Bessias”. Em conversa gravada pela Polícia Federal entre Dilma e Lula em que foi combinada a posse do petista como ministro da Casa Civil ele foi mencionado. O outro caso foi o pedido de sigilo de cerca de 760 documentos envolvendo a Odebrecht, empreiteira superamiga dos petistas, investigada na Lava Jato.

A LAI prevê que o sigilo de 100 anos – prazo máximo concedido por lei – pode ser imposto quando a publicidade dos dados viola a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem de uma pessoa. Identificar os abusos gerados no uso desse ponto, para evitá-los, é o que precisa ser feito, inclusive porque o uso político parte não apenas de quem proíbe a informação, mas também de quem a solicita.

A direção atual a Controladoria Geral da União (CGU) alega que não há abusos da gestão Bolsonaro no uso do sigilo secular, mas os petistas dizem o contrário. O próprio Lula, no arroubo próprio de populista, disse que iria revogar o decreto que regulamenta os processos de pedido de informação, o que a transição que trata da área não aconselha.

O que é exigido, por todos que clamam por decência na política e por transparência de verdade, é que a proteção do direito à privacidade, permitida na lei, não seja usada para blindar agentes políticos e autoridades. Sejam elas quem forem, de qualquer ideologia que representem.