O Ministério do Meio Ambiente (MMA) divulgou no final da tarde desta quarta-feira, 21, uma nota em que expressa ser um “risco à segurança ambiental e social” do Brasil o Projeto de Lei (PL 2159/2021) aprovado conjuntamente pelas Comissões de Meio Ambiente e de Agricultura no Senado Federal, e que atualiza o licenciamento ambiental no país, com intuito de agilizar processos que exigem aval do meio ambiente e atualizar a legislação.
“É uma desestruturação significativa do regramento existente sobre o tema. Além disso, afronta diretamente a Constituição Federal, que no artigo 225 garante aos cidadãos brasileiros o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com exigência de estudo prévio de impacto ambiental para instalação de qualquer obra ou atividade que possa causar prejuízos ambientais,” registra a nota.
O MMA avalia também ser um retrocesso a proposta denominada Lei Geral do Licenciamento Ambiental. “O Estado não pode adotar medidas que enfraqueçam direitos,“ diz o documento, com indicativo de que poderá recorrer ao STF para tentar reverter uma decisão do Senado Federal em Plenário ao imaginar que haverá “altos índices de judicialização.”
“O texto contraria, ainda, decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceram a inconstitucionalidade da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para atividades de médio impacto ambiental,” diz.
A nota do MMA critica descentralização para Estados, com a permissão de que a definição de atividades sujeitas ao licenciamento ambiental ocorra sem coordenação nacional e fora do âmbito de órgãos colegiados, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e os Conselhos Estaduais e Municipais.
Para o ministério, isso vai desarticular mecanismos de participação social e “pode promover a ação descoordenada entre União, Estados e Municípios no processo de licenciamento ambiental,” diz o texto.
O MMA relaciona os principais retrocessos trazidos pelo PL 2.159/2021:
Licença por Adesão e Compromisso (LAC)
Um dos pontos mais críticos do PL é a aplicação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), modalidade simplificada de licenciamento baseada na autodeclaração do empreendedor. A proposta permite que empreendimentos de médio porte e potencial poluidor utilizem esse mecanismo sem a exigência de estudos prévios de impacto e sem a definição de condicionantes ambientais específicas.
Na prática, o texto permitiria o uso da LAC para um percentual expressivo de empreendimentos que atualmente são licenciados. Além disso, esses empreendimentos seriam monitorados por amostragem, dispensando a necessidade de fiscalização, pelo órgão ambiental, de todos os empreendimentos licenciados por essa modalidade.
A proposta também prevê a aplicação da LAC a projetos como duplicação de rodovias e dragagens, inclusive em regiões sensíveis e habitadas por comunidades vulneráveis, que podem ser autorizados sem qualquer análise técnica prévia, aumentando o risco de danos ambientais e sociais.
Fragilização do SISNAMA e do papel do ICMBio
O PL retira atribuições técnicas e normativas dos órgãos colegiados do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama), como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e os Conselhos Estaduais. Ao transferir competências decisórias para entes federativos de forma descoordenada, pode estimular uma “concorrência antiambiental” entre estados e municípios, que, no intento de atrair mais investimentos, poderão oferecer flexibilizações e padrões menos rigorosos que os municípios ou estados vizinhos.
Além disso, o texto enfraquece o papel do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ao permitir que empreendimentos em unidades de conservação sejam licenciados sem a manifestação obrigatória prévia do órgão gestor da área.
Omissão ante impactos indiretos e sinérgicos
Outro ponto apontado como retrocesso é a exclusão, pelo PL, das áreas de influência indireta (AII) nos estudos de impacto ambiental. A medida compromete a análise de impactos cumulativos, como desmatamento, pressão sobre comunidades indígenas, contaminação de corpos d’água e grilagem de terras — frequentemente decorrentes de grandes empreendimentos como hidrelétricas, estradas e portos.
Dispensa para atividades agropecuárias
A proposta admite que os empreendedores questionem o estabelecimento de condicionantes ambientais de impactos indiretos com base na ausência de “nexo causal comprovado” ou por não terem “poder de polícia” sobre as ações de terceiros.
A comprovação do nexo causal direto pode dificultar ou inviabilizar a imposição de medidas preventivas e compensatórias, tendo como exemplo o caso da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em que a dificuldade em atribuir responsabilidade por impactos indiretos comprometeu a reparação de danos às comunidades afetadas e ao meio ambiente.
O PL prevê ainda que atividades como agricultura e pecuária sejam dispensadas de licenciamento ambiental caso estejam inscritas no Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou aderidas ao Programa de Regularização Ambiental (PRA).