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Petróleo na foz do rio Amazonas: o que o distinto público precisa saber

É uma encrenca maior do que Belo Monte. Há mais ONGs interferindo, existe uma discussão sobre o fim do combustível fóssil e há interesse geopolítico e econômico envolvido.
Mapa Margem Equatorial, zona de potencial petrolífero. Fonte: Petrobras.

A divergência que surgiu na imprensa, revelada, aliás, pelo Estado de São Paulo, sobre o projeto de exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas colocando a Petrobras de um lado e o Ibama de outro é coisa antiga. E, antes de contar desde quando ela surgiu, vale deixar registrado o seguinte: qualquer que seja a decisão do governo nós, que vivemos na Amazônia, precisamos ter voz. Todos, indistintamente.

Em segundo lugar. O sr. Lula da Silva dizer lá no Japão que o meio ambiente é prioridade é discurso subalterno aos interesses estrangeiros, e nada mais é do que um encadeamento de frases e atitudes ditas nas sucessivas viagens que já demonstraram a que veio o governo, inclusive ao colocar novamente Marina Silva no Meio Ambiente. Radical,  ela sempre preferiu entendimento com organizações não-governamentais do que colaboração mais estreita com os governos constituídos pelo voto na Amazonia Legal.

É subalterno porque aqui dentro não há, efetivamente, política para o desenvolvimento da Amazonia. Aqui dentro, a dubiedade e falta de direção para os grandes interesses nacionais são gritantes. O que temos é o Fundo Amazonia, bancado por estrangeiros. Não há uma política voltada para  contemplar prioritariamente os interesses do pequeno produtor, pescadores, ribeirinhos, empresários rurais, fazendeiros, gente que foi chamada a produzir no oeste do Brasil.

E a política teria de ser uma política de Estado, uma ausência eterna, de governo em governo. Afinal a região corresponde a 60% do território nacional, é a maior reserva do mundo de vocação desenvolvimentista em novos paradigmas, com uso adequado dos recursos naturais, que deveria urgentemente estar lastreada em investimentos em ciência, tecnologia e inovação. O BNDES de Lula3  não propõe e financia tais condições, mas cogitou financiar a falida Argentina em um projeto altamente poluidor, o gasoduto Vaca Muerta.

A ausência dessa política, de longa data desprezada, me incomoda. E, ao identificar que o projeto de exploração de petróleo na bacia do rio Amazonas está no Plano Estratégico da Petrobrás de 2023-2027, um novo incomodo: como é que esse projeto passa batido ao distinto público da Amazonia durante a campanha?

A celeuma que ganhou manchetes é um dos doze blocos na Foz do Amazonas concedidos em 2013 na 11ª rodada de licitações da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). É o bloco FZA-M-59, que abrange os Estados do Amapá e parte do Pará, e por isso o governador paraense Helder Barbalho (MDB) esta semana se manifestou a favor da Petrobrás, reclamou que a França explora petróleo na região há 10 anos.

Saíram também a favor do projeto os senadores do Amapá, Randolphe Rodrigues (sem partido) e Davi Alcolumbre (União Brasil). Ambos se movimentam no Ministério de Minas e Energia e Petrobras para que o projeto tenha a licença que o Ibama nega há mais de 9 anos.

A negada pelo Ibama na quarta-feira, 17, seria para um teste pré-operacional para analisar a capacidade de resposta da Petrobras a um eventual vazamento. O pedido é para perfurar um poço em um bloco de exploração a cerca de 170 km da costa. O teste também permitiria à empresa analisar o potencial das reservas de petróleo na região.

É um projeto complexo e localizado em região de sensibilidade ecológica, com fragilidades geológicas não estudadas, e que nem mesmo o dever do Ministério de Marina Silva foi feito, que é uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) para as bacias sedimentares que ainda não contam com tais estudos e que ainda não possuem exploração de petróleo.

Segundo o Ibama, é uma análise estratégica que permite identificar áreas em que não seria possível realizar atividades de extração e produção de petróleo e gás em razão dos graves riscos e impactos ambientais associados.

É uma regra ignorada desde o começo, em 2014. Não foi feita para o conjunto de doze blocos leiloados em 2013, nenhum deles com licença ambiental. Tudo parado. Eles se constituem no que se chama Margem Equatorial, alcançando seis estados (Amapá, Pará, Ceará, Piauí, Maranhão e Rio Grande do Norte), na região onde o Amazonas se encontra com o Oceano Atlântico, portanto muito além do rio Amazonas.

É considerada uma espécie de “pré-sal” para exploração de petróleo, com volume estimado em 30 bilhões de barris de petróleo. Nenhum deles obteve autorização para o teste de perfuração dos poços marítimos. No caso do bloco FZA-M-59, a concessão ficou com a britânica BP Energy (70%) e Petrobras (30%), mas a demora nos procedimentos de ordem ambiental foi tão grande que a britânica desistiu da exploração. Em 2021, a Petrobras assumiu o projeto sozinha.

Muitos pareceres técnicos tem sido emitidos pelo Ibama desde 2015. Mais recente, entre 2022 e 2023, o órgão tem informado pendências a serem sanadas pela empresa para dar continuidade do licenciamento ambiental, como a comprovação da viabilidade ambiental da perfuração de poços na região, com ajustes no Plano de Emergência Individual. Por exemplo, buscar formas de desburocratizar as ações de respostas transfronteiriças em caso de acidentes.

Ao negar o pedido de licença para a Petrobras, o presidente do Ibama Rodrigo Agostinho, após dias de pressão, disse que os riscos da exploração de petróleo ali são mais alto do que em outras regiões onde a Petrobras já extrai o produto. “É situação de alto risco. Lá não é mesma situação das bacias de Campos e de Santos,” contou ao Estadão.

Para o Ibama, não foi demonstrada viabilidade e logística para atender eventual acidente, referindo-se aos planos apresentados pela Petrobras, em que uma embarcação fica a 40 horas do local da extração por exemplo. Em nota na qual noticia o indeferimento de licença à empresa, no site do Ibama, a instituição registra fragilidade ambiental gigante.

“A bacia da foz do Amazonas é considerada uma região de extrema sensibilidade socioambiental por abrigar Unidades de Conservação (UCs), Terras Indígenas (TIs), mangues, formações biogênicas de organismos como corais e esponjas, além de grande biodiversidade marinha com espécies ameaçadas de extinção, como boto-cinza, boto-vermelho, cachalote, baleia-fin, peixe-boi-marinho, peixe-boi-amazônico e tracajá,” diz.

É uma encrenca ainda maior do que a hidrelétrica de Belo Monte acredito eu. Há mais ONGs interferindo, existe no mundo uma discussão sobre o fim do combustível fóssil e há muito mais interesse geopolítico e econômico envolvido quando se trata de petróleo. Que, entendam os radicais da energia limpa, é uma riqueza que não dá para riscar do mapa da vida atual de uma hora para outra.