Sem correção de rota, governo entra em colapso em 2027, diz estudo da Câmara

Presidente Lula disse que se depender dele não fará ajuste fiscal este ano; consultores sugerem envio de ajustes estruturantes até abril, prazo legal para entrega do PLDO 2026.
Paulo Bijos, um dos autores do estudo, foi até julho secretário do Orçamento Federal. Foto: Washington Costa.

Sem correção na rota fiscal, o governo federal irá quebrar em 2027, quando não haverá recursos para assegurar serviços básicos do Estado, manter o funcionamento da administração pública e promover investimentos. Se depender do que disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no final de janeiro, ajustes fiscais em 2025 estão descartados.

A data marcada para o colapso é um alerta contido no estudo “Projeções fiscais e orçamentárias: o desafio das despesas discricionárias,” elaborado pelos consultores Dayson Pereira de Almeida e Paulo Bijos, da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira Núcleo de Economia e Assuntos Fiscais (Conof) da Câmara dos Deputados. Até julho passado, Bijos foi secretário   do Orçamento Federal do Ministério do Planejamento.

Os analistas avaliam as “pressões” e “alívios” sobre as despesas primárias – programas de governo, bens e serviços públicos como saúde e educação, investimentos, despesas com pessoal e manutenção da máquina pública etc. – para 2025, em diálogo com o limite de gastos disciplinado pelo Regime Fiscal Sustentável (RFS), instituído pela Lei Complementar nº 200, de 2023 (LC nº 200/2023).

A sustentabilidade dessa norma, dizem, está associada a um indicador-chave do ponto de vista do orçamento, que são a possibilidade de uso das despesas discricionárias (livres) do Poder Executivo, base principal do estudo. Se o governo não tem mais recursos livres para programas diversos, em razão do engessamento fiscal, há risco de colapso.

“Por esse prisma, antevê-se cenário crítico de achatamento do espaço discricionário no orçamento federal, cuja reversão dependerá de medidas estruturais capazes de moderar o ritmo de crescimento do gasto público nos próximos anos, sobretudo no campo das despesas obrigatórias,” diz trecho do estudo.

A trajetória de redução das despesas discricionárias acontece aceleradamente, e embora a contenção contida no orçamento de 2025 possa dar algum alívio temporariamente, a crise se instala em 2027, quando as despesas obrigatórias, como previdência, emendas parlamentares e gastos constitucionais com saúde e educação, consumirão todo o orçamento, segundo os consultores.

Os consultores listam fontes de “alívio” no gerenciamento do orçamento de 2025 como o limite de despesa primária do Poder Executivo ampliado de R$ 2.161,9 bilhões (valor de 2024) para R$ 2.174,3 bilhões em 2025, o que corresponde a aumento de R$ 12,4 bilhões, e R$ 10,4 bilhões em programas/políticas com valores reduzidos no PLOA 2025.

Entre eles estão Escola em Tempo Integral (R$ 4,8 bilhões); despesas afetadas pela desvinculação de receitas da União (DRU), com destaque às despesas primárias (não reembolsáveis) do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT (R$ 3,6 bilhões); e Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (R$ 2 bilhões).

Os valores somados – R$ 22,8 bilhões – contribuem para mitigar a pressão de R$ 45,6 bilhões em despesas primárias no orçamento deste ano, mas não neutraliza, observam os consultores, havendo um R$ 22,8 bilhões de pressão líquida a ser equacionada.

Dayson de Almeida e Paulo Bijos mostram preocupação com o gasto em investimentos porque o RFB estabeleceu a observância de um piso para isso durante a elaboração dos orçamentos anuais, que deve ser preservado ao longo de todo o exercício financeiro na forma de dotações autorizadas.

E o uso livre pelo Executivo das despesas discricionárias é cada vez mais estreito.  Essas despesas absorvem também gastos com saúde e educação, mesmo que tenham piso obrigatório, áreas em que há necessidade de mais aportes; as emendas destinadas por lei à saúde e investimentos em meio ambiente, defesa, agricultura infraestrutura etc.

“As projeções de médio e longo prazos indicam é que medidas gerenciais ou ajustes fiscais pontuais são certamente insuficientes. Ajustes estruturais mais vigorosos se impõem como necessários para viabilizar a orçamentação pública discricionária e, consequentemente, a própria sustentabilidade da regra fiscal de despesa em vigor,” diz o estudo.

Esforço deve recair sobre despesas

Os consultores alertam:  o atual cenário fiscal-orçamentário é preocupante do ponto de vista de espaço disponível para a acomodação de despesas discricionárias. Nesse contexto, advertem que, “em se tratando de limite de despesas primárias, todo o esforço de ajuste deve recair sobre as próprias despesas. Aumentos de receita, afinal, não têm o condão de criar espaço fiscal no curto prazo, tendo em vista o que limite de despesa é fixo.”

Almeida e Bijos reafirmam não bastar medidas pontuais, sugerindo que “um horizonte temporal adequado para a apresentação de medidas estruturais seria até 15 de abril de 2025, que é a data limite para o encaminhamento do projeto de lei de diretrizes orçamentárias da União para 2026 (PLDO 2026) ao Congresso Nacional.” 

Os consultores lembram que o PLDO é o instrumento eleito pelo arcabouço constitucional e legal do país para o trato da questão fiscal orçamentária no médio e longo prazos (art. 165, § 2º, da Lei Magna, e art. 4º da Lei Responsabilidade Fiscal).

“É no PLDO 2026, em suma, que serão traçadas duas novas ‘curvas’ estratégicas. Uma de médio prazo (quatro anos), para metas fiscais; outra de longo prazo (10 anos), para dívida bruta. Trata-se, enfim, de momento-chave no que tange: à demonstração da estratégia concebida para viabilizar a sustentabilidade fiscal e orçamentária da União; e à renovação de expectativas de agentes econômicos acerca da saúde fiscal do Brasi,” afirmam.

Estudo Projeções fiscais e orcamentárias: o desafio das despesas discricionárias