Um trem da alegria em meio à greve na educação, corte de recursos da PF e Defesa e expansão de gastos públicos

O governo diz que vai se esforçar para derrubar a PEC do Quinquênio no Plenário; onde estavam articuladores para evitar voto na CCJ de senador da base, ao menos?
Reunião da CCJ do Senado aprovou com 18 votos quinquenio para o judiciário. Foto: Edilson Rodrigues.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado patrocinou na quarta-feira, 17, uma espécie de trem da alegria para categorias  privilegiadas no serviço público brasileiro. A Comissão tem 27 membros, votaram 25: 18 a favor e apenas 7 senadores contra a PEC do Quinquênio, assim conhecida a proposta de emenda à Constituição nº 10.

Originalmente, a PEC prevê a concessão, a título de estimular a carreira da magistratura, de bônus a membros do Judiciário e do Ministério Público, instituindo parcela mensal de valorização por tempo de exercício de juízes, promotores e procuradores. A cada 5 anos de serviço, os subsídios serão acrescidos de 5%.

O que era ruim para esse momento, ficou pior: o relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO), apresentou um substitutivo para alegrar muito mais passageiros no trem.

Como se não bastasse, um detalhe fenomenal que causa mais espanto em tempos de greve da educação, expansão de gastos públicos, corte de recursos da Polícia Federal, da Defesa e Abin, resultados negativos em estatais e mais gente querendo partir para a paralisação: o benefício é extra teto constitucional de remuneração, fixado hoje em R$ 41.650,92, salário dos ministros do STF.

“O teto constitucional está sendo dispensado como se a gente não tivesse em nosso País um problema de gastos públicos. É assombroso dispensar o teto constitucional,” alertou o professor Antônio Carlos de Freitas Jr, mestre em Direito Constitucional pela USP e especialista em Direito eleitoral, em entrevista ao Estadão.

Com espanto, os sete senadores que na quarta-feira votaram contra a PEC perguntavam ao relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO), sobre o impacto da medida nas contas públicas, e a resposta sobre isso e de onde sairá o dinheiro (obrigação legal dizer) foi um eloquente silencio.

“Cadê o estudo de impacto? Quanto vai custar isso? Nós vamos passar um atestado que nós nunca lemos a Constituição se nós aprovamos essa proposta,” disse o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR).

“A pressão sobre os governadores será imensa. Como ex-governador, quero dizer que é a pior política de gestão de pessoal que se tem é a do anuênio e do quinquênio, porque ela não fala em meritocracia, ela é um aumento vegetativo da folha independente do gestor,” disse outro voto contrário, senador Jaques Wagner (PT-BA).

Os desdobramentos da iniciativa continuaram na quinta-feira,18, com muita crítica, indicativo de impacto em diferentes cálculos, de R$ 1,8 bilhão já este ano a mais de R$ 40 bilhões, e com a informação de que o governo Luiz Inácio Lula vai “se esforçar” para evitar a aprovação da PEC no Plenário do Senado.

Ora, ora. Matuto comigo sobre um esforço atrasado, e se a declaração é para valer ou para inglês ver. Com as metas fiscais em frangalhos, revisão de gastos inócua e confusão entre os poderes, não teria sido mais fácil o governo tentar cortar o mal pela raiz na CCJ? Onde estão os articuladores que sequer evitaram senador da base votar contra?

Tremzão da alegria

É assombro nesses tempos o relator ter acolhido integralmente as emendas dos senadores Efraim Filho (União-PB), Alan Rick (União-AC) e Ângelo Coronel (PSD-BA), defensores e advogados públicos; do senador Weverton (PDT-MA), incluindo agentes do Poder Legislativo da União, inclusive Tribunal de Contas da União (TCU) e servidores do Poder Judiciário, e de Lucas Barreto(PSD-AP), beneficiando os conselheiros do TCU, dos TCEs e dos municípios.

É ou não um tremzão da alegria? Guardem esses nomes e de todos que votaram em algo que não faz nenhum sentido e justiça, em momento delicado das finanças públicas, que causará mais desigualdade social e expandirá os gastos públicos.

A PEC atendia as categorias elencadas no início desse artigo, algo desejado há muito por elas em um país em que há 4 mil vagas para a magistratura.

No parecer, o relator diz para justificar o mérito da PEC: “Magistrados que ocupam cargo isolado ou galgam a última classe da carreira, mesmo que permaneçam uma década no cargo, percebem hoje o mesmo subsídio daquele que detém apenas um ano no mesmo cargo. Essa situação de óbvia quebra de isonomia, por tratar igualmente os de situação desigual, atinge gravemente a Magistratura Nacional.”

Argumenta que as categorias juiz, procurador e promotor trabalham fins de semana, feriados, sem receber contrapartidas – não é bem assim -, e que o bônus substituirá quaisquer vantagens dos agentes públicos incluídos em seu substitutivo que estejam sendo pagas sob fundamento “de adicional de tempo de serviço, para evitar qualquer forma de bis in idem (duplicidade) em seu pagamento.”

Se não há segurança nisso, e não há,  fica parecendo a história de “na volta a gente compra.” Vai acumulando penduricalhos, e para tirar a gente sabe como é: os privilegiados sempre dão um jeito para que isso não aconteça.

Pobre Brasil.

Substitutivo PEC do Quinquenio