Vai ficar feio para o Senado Federal se ficar o dito pelo não dito

Vai ficar também totalmente desacreditado se não levar adiante proposta de fixação de mandato para os semideuses do Supremo, que estão dividindo o Brasil do mesmo modo que os políticos minúsculos, populistas do atraso e da inoperancia.
Pacheco ao lado de Lira: o dito pelo não dito terá um preço. Edilson Rodrigues.

Vai ficar feio para o Senado Federal se ficar o dito pelo não dito. Ou seja: não colocar em debate e votação projetos que limitem o mandato de ministros do STF e sua exacerbada produção de decisões monocráticas.

A “rebelião” com ação de desengavetar proposta de emenda constitucional e projeto de lei nessa direção teve início no dia 21 de setembro, logo após o Supremo fixar a tese do marco temporal, por 9 votos a 2. A bancada ruralista ameaçou obstrução e, ao que tudo indica, ficou só na ameaça mesmo.

São onze semideuses – expressão cunhada pelo senador Plínio Valério – em onze ilhas, decidindo isoladamente de tudo um pouco, como mandar prender senador, impedir nomeação de ministros de governo, suspender licitação de obra de interesse nacional, decidir sobre tema sensível à sociedade, como aborto etc.

Houve um tempo, e ele voa em mais de duas décadas, que o monocratismo era combatido pelo conjunto do Pleno, como no caso de uma decisão liminar de Marco Aurelio Mello, aposentado, permitindo o aborto de fetos anencefálicos.

Esse era um caso em que aos olhos dos demais poderes e da sociedade se expandiam os limites de uma atuação individual. A Corte ainda mantinha uma deferência aos demais poderes e, por isso, o caso foi analisado pelo conjunto dos ministros.

O fato é que a Suprema Corte se tornou cada vez mais política, e com a justificativa de ser demandada pela sociedade para analisar casos em que o Congresso Nacional deixa dormitando comete o grave erro de querer ir além do que deveria.

Como agora, no caso da questão da descriminalização das drogas, querer regular o quanto cada indivíduo dever portar de maconha, por exemplo, para seu consumo individual. Absurdo!

Eles não foram eleitos para fazer esse debate, definir uma regulamentação e nem mesmo elaborar a lei que exige tal norma.

O marco temporal trouxe a insurreição do agro, mas há um engasgo de modo geral espraiado no Congresso com a Corte, que em nome da defesa da democracia durante o processo eleitoral justificou todas as censuras e arbitrariedades feitas a pessoas ligadas a um grupo político, por meio de um inquérito que tudo nele cabe, em detrimento de outro grupo, que hoje está no poder.

De longe, em Paris, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse no sábado, 14, não haver crise entre o Poder Legislativo e pelo menos parte do Judiciário porque cabe aos congressistas decidirem sobre grandes questões do Brasil.

Até mesmo quando não decide, realçou, “é também uma forma de fazer posição política.”

Ele não deixa de ter alguma razão, mas postergar indefinidamente temas que são muitas vezes são postos em pauta pelos próprios parlamentares tem elevado custo político.

Por isso, é bom mesmo o Senado se mexer, porque do jeito que as coisas vão é bem capaz do autoritarismo que muitos julgam existir nas hostes bolsonaristas tão-somente, desnude ações pontuais de dentro do executivo com amparo na corte suprema, de maioria simpática ao atual projeto de poder, que acabem por avalizar a necessidade da inexistência de um congresso bicameral.

Não se duvide disso, afinal há tempos setores do PT defendem o legislativo unicameral.

Pacheco negou também ser retaliação colocar em debate os projetos para frear o ímpeto imperial e político do STF.  Diz que os levará adiante, mas não estabeleceu data para o debate.

O ano legislativo está acabando, e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), quer engavetar essa história de contenção do STF. O que está por trás da mansidão com que trata a Suprema Corte? Que, aliás, o livrou de dois recentes processos penais?

A Constituição garante ao Senado Federal a iniciativa de dar um freio de arrumação no STF. Mas há um ceticismo amplo na sociedade em relação às medidas que o Senado anunciou simplesmente porque esses “arroubos”, vistos não passado, em outras circunstancias e elementos, não se concretizam.

Tudo então é visto como jogo da política desonesta, de troca, uma barganha para benefício individual de quem está no comando de determinado poder.

Além de feio, vai ficar totalmente desacreditado, mais do que em certa medida é, o Senado Federal não levar adiante proposta de fixação de mandato para os semideuses do Supremo, que estão dividindo o Brasil do mesmo modo que os políticos minúsculos, populistas do atraso e da inoperância, que só pensam em eleição e em se dar bem.

E tudo porque suas onze ilhas fazem mais política do que nunca.

Um mandato de oito anos para Suas Excelências evitará a erosão da mais alta instancia judicial, que se nota gradativa, pois se revela comprovadamente leniente com os crimes de colarinho branco, punitivista com os remediados e opositores do poder de plantão, vingativo com os que combatem a corrupção.