O mais político dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, gosta de dar entrevistas, antecipa votos pela imprensa, hostiliza a opinião pública e, sempre que tem a oportunidade conveniente, profere decisões que causam estranheza e muita, muita desconfiança.
Por exemplo, interromper prisões preventivas de graúdos políticos, como o ex-prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos), e mais recentemente (agosto de 2020) a do secretário de Transportes de João Dória, Alexandre Baldy (PP) – um político de Goiás que foi parar em São Paulo! Aí tem, não é governador?
Mas vamos em frente. Quero aqui falar do Gilmar, o ministro que para o senador Jorge Kajuru, um dos integrantes do grupo Muda Senado, vende sentenças e sempre ganhou um dinheirão com o seu Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Nada demais as relações empresariais com o executivo federal não fosse ele quem é.
Por seu apreço de longa data à política mais do que à toga, assim me parece especialmente em momentos de tensão na vida política nacional, como em 2016, ano do impeachment de Dilma Rousseff, e agora, ano pré-eleitoral, é que em 2009 Joaquim Barbosa bateu boca com ele e tascou: “Vossa excelência está na mídia destruindo a credibilidade do Judiciário brasileiro.”
Vira e volta Gilmar dá um empurrãozinho para piorar. A indigna posição do magistrado na sessão de julgamento do HC 164.493, realizada pela 2ª turma do STF em 9 de março, um dia após o ministro Edson Fachin, por uma falha procedimental – foro inadequado – anular quatro ações contra o ex-presidente Lula, fratura ainda mais a instituição que melhor encarna no judiciário a impunidade para crimes de colarinho branco.
Relator do HC sobre a suspeição de Sérgio Moro na Lava Jato, Gilmar Mendes bateu duríssimo nos procuradores, no ex-juiz e na operação. Fez generalizações e desqualificou a justiça federal nos estados, tanto que uma nota de repúdio foi emitida pela entidade que a representa. Falou como se estivesse se dirigindo a seus “capangas”, como disse Barbosa naquela inesquecível sessão, utilizando-se de impropérios. Falava ali o político, não o magistrado.
Gilmar Mendes taxou a Lava Jato de “o maior escândalo judicial da história,” dividindo o tempo de leitura jurídica com as transcrições das mensagens de celulares dos investigadores e do ex-juiz Sergio Moro ilegalmente obtidas. Em muitas outras ocasiões, chamou de “cretinos” os procuradores.
Nem sempre foi assim, e olhem que a suspeição sobre o juiz Sérgio Moro esteve em xeque permanentemente pela defesa de Lula mesmo antes de surgirem as mensagens hackeadas do aplicativo telegram usado nos celulares do pessoal da Lava Jato.
Gilmar Mendes fazia loas à Lava Jato, e era favorável à competência abrangente da 13ª Vara de Curitiba: “A pura e simples divisão das investigações não permitiria o acompanhamento do contexto, relegando ao fracasso qualquer esforço sério de persecução”.
Disse também, no começo das investigações, ao defender que Moro assumisse os vários casos: “Sejam os crimes ligados a Petrobras ou não, todos estão inseridos no mesmo contexto, todos parecem convergir para o já mencionado método de governar.” Quando a Lava Jato chegou ao calcanhar dos tucanos, ele passou a critica-la.
Sabemos que não apenas Gilmar muda opiniões e votos, o que é passível de ocorrer certamente, mas no caso do ministro e de alguns outros como Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski, as oscilações promovem desconfiança, e isso é péssimo para o STF. Precisam ser investigados sim como tanto pedem os senadores do Muda Senado.
O ministro Edson Fachin, que recuperou o direito político de Lula, em 10 ocasiões pelo menos, relata a Folha de São Paulo, rejeitou retirar processos da Lava Jato de Curitiba. De perfil discreto, com 12.800 atos decisórios proferidos nos autos da Lava Jato desde que assumiu a relatoria em fevereiro de 2017, por que Fachin somente agora anula tudo que diz respeito ao ex-presidente dizendo ser o foro (Curitiba) das ações inadequado?
É uma estranha decisão, que deveria ser levada ao Pleno, algo que inclusive prometeu Luiz Fux ao assumir a presidência do STF em setembro passado. Ele prometeu retirar das duas turmas controversos julgamentos de ações penais, justamente para evitar o balaio de gatos em que se transformaram as decisões monocráticas sobre idênticos assuntos.
A oscilação da posição dos ministros em casos emblemáticos e urgentes para o país, o tempo prolongado para decidir, com elevado custo para a nação e as frequentes decisões monocráticas em temas que deveriam ir ao Pleno são um escárnio e corroem a missão institucional da suprema corte.
Pobre Brasil.