O presidente Jair Bolsonaro acaba de dar mais uma demonstração de que costuma rugir como um leão com os pequenos e vulneráveis e miar como um gatinho para os grandes, como o presidente Donald Trump, por exemplo.
A perversidade exibida diariamente nas lives e “entrevistas” acerca do padecimento da morte de centenas de pessoas por dia no Brasil, em decorrência do coronavírus, atravessou mares e ninguém mais tem dúvida no mundo da sua incapacidade de administrar a crise sanitária que afeta o Brasil e vários países.
Desde o começo tratou o problema de forma ideológica, levando fanáticos seguidores a desprezarem recomendações sanitárias, e alimentou um falso dilema: de que a economia precisa ser salva, e não as pessoas, elas vêm depois, e daí, porque sem economia não há emprego, as pessoas não têm dinheiro e assim morrem sem comida, sem teto sem nada.
O tempo todo prega contra o isolamento social, como se fosse o método de inibir a proliferação do vírus o causador da crise econômica. É a pandemia que causa a crise que, vamos admitir, já existia bem antes dela nos atingir em cheio.
Depois, Bolsonaro passou a ser notado mais amiúde por sua pregação não convincente da defesa da economia. Marco disso é cravado nesta terça-feira, 19: a sanção, após quase um mês de aprovada, da lei que ajuda os pequenos e médios empresários a saírem do sufoco, a respirarem para retomar a vida logo adiante, reabrindo suas portas e resgatando empregos.
A lei concede uma linha de crédito especial para pequenas e microempresas pedirem empréstimos de valor correspondente a até 30% de sua receita bruta obtida no ano de 2019. Ela institui o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), com um tratamento perene, pós-pandemia, e foi aprovada no Senado Federal depois de votada na Câmara dos Deputados, em 24 de abril.
Bolsonaro a sancionou com diversos vetos, e destaco um em especial: ao artigo que concede uma carência de 8 meses para os pequenos e médios empreendedores iniciaram o pagamento dos empréstimos.
Vejam a alegação para o veto: a medida contraria o interesse público e coloca em risco a execução do programa, ante a incapacidade dos bancos públicos executarem o programa com as condições apresentadas.
É crueldade. Evidente que as condições para os bancos executarem essa política pública, se inexistentes, podem passar a existir. É uma decisão política.
Saibam meus diletos leitores que a lei que instituiu essa política para os micro e pequenos empreendedores com taxa de juros anual vantajosa foi aprovada mediante substitutivo apresentado pela deputada Joice Hasselmann, hoje arqui-inimiga da família Bolsonaro.
“Nós precisamos deixar todas as portas, janelas e chaminés abertas contra o desemprego. Vamos abrir o coração para que tudo seja feito para manter essas empresas de pé. Não vamos encarar isso como uma porteira aberta para demissões. É por extremíssima necessidade.”
A retórica da senadora deveria ser mantra no coração do governo também. Jamais o será. Lembrem-se: os R$ 600 reais de auxílio emergencial saiu por obra do Congresso Nacional, instituição que os boçais bolsonaristas querem riscar do mapa. O governo queria conceder apenas R$ 200!
Eu não duvido, e já leio entrevistas de micro empreendedores, líderes e consultores do mercado, de que há componente político forte para a demora no tramite das operações até agora disponíveis e anunciadas, como a linha de crédito do BNDES para capital de giro.
A reclamação é geral. Poucos tiveram acesso, pesquisa feita pelo Sebrae Nacional revela isso. Alguém duvida de que o mesmo não irá acontecer com o Pronampe? Para vigorar, precisa de regulamentação. Vai demorar mais um mês?
O estudo do Sebrae mostra que 86% dos pequenos empresários que solicitaram crédito para manter seus negócios não conseguiram ou têm pedidos em análise. Desde o início das medidas de isolamento no Brasil, apenas 14% daqueles que solicitaram crédito tiveram sucesso.
Outro dado da pesquisa: cresceu em 8 pontos percentuais a proporção de empresários que buscou crédito entre 7 de abril e 5 de maio deste ano. Outro dado apreensivo da pesquisa: 90% das empresas de micro e pequeno porte registram queda nas receitas.
Esta realidade é indiferente a Bolsonaro. Ele poderia reduzir a carência, não poderia? Preferiu rugir no cangote do pequeno empreendedor, que vai pegar o empréstimo, se conseguir, e se virar nos trinta para começar a pagar no mês seguinte, a menos que o Congresso Nacional derrube o veto.
Pobre Brasil.