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Contra o isolamento, uma confissão criminosa: “Quero todo mundo armado!”

Procuradores veem crime de advocacia administrativa em atos de Bolsonaro.
Reunião ministerial na qual Bolsonaro chamou palavrões e se exaltou. Foto: Divulgação.

Presidente incita o armamento como forma de se rebelar contra o isolamento social.

Uma das falas de Jair Bolsonaro que mais me chamaram a atenção na reunião de botequim de quinta categoria  ilustra o título deste Contraponto. É ou não é uma confissão criminosa? Mais: arrematada pela cobrança, de ofício, aos ministros Sérgio Moro (Justiça) e Fernando Azevedo e Silva (Defesa) de uma portaria para aumentar a quantidade anual de munições, o que foi feito. O número de balas passou de 200 para 600, três vezes mais, por arma de fogo, conforme revelado com exclusividade pelo O Estado de São Paulo.      

Sérgio Moro, entrevistado pelo Fantástico, disse que assinou a portaria por se sentir pressionado por Bolsonaro e por querer evitar um novo “flanco de conflito” já que tentava evitar mudanças na Polícia Federal sem que o presidente lhe apresentasse as razões.

O vídeo da reunião, uma das indicações de Moro para comprovar a interferência na PF, deixa claro, para procuradores da República, que o presidente cometeu o crime de advocacia administrativa – valer-se de função pública em benefício de interesses pessoais. Bolsonaro diz com toda as letras que precisa proteger familiares e amigos, que vai fazer mudanças no governo. “Não estamos para brincadeira!.” O enredo de antes e depois da reunião sustenta a narrativa de Moro.

O encontro de botequim transcorre entre paranoias e fanatismo ideológico, com exceção da fala de alguns colaboradores como Rogério Marinho, ministro do Desenvolvimento e Gustavo Montezano, presidente o BNDES, e embora Jair Bolsonaro diga que o governo não está “em desespero”  porque não é “acusado de corrupção”, é exatamente o oposto do que diz: o Pró-Brasil é coadjuvante, encolheu perante o Pró-Bolsonaro.

Por diversas vezes no  encontro a pretexto de apresentação do plano, o presidente se exalta, fala palavrão e pede que os ministros tirem a “cabeça da toca, se exponham,” saiam em sua defesa e, contrariado, diz que quem for elogiado pelos jornais o Globo e Folha de São Paulo sera demitido. Vemos um Bolsonaro aflito.

A pregação para armar o povo, eis um novo perigo jurídico para Jair Bolsonaro, vem após a fala desrespeitosa do “militante”  ministro Abrahan Weintraub contra ministros do STF, não repreendida pelo presidente e que poderá lhe custar o cargo.

“Eu quero todo mundo armado! Que povo armado jamais será escravizado,” disse o presidente, deixando explicito seu ódio ao isolamento social e o incitamento a uma guerra civil:  “Um bosta de um prefeito faz um bosta de um decreto, algema, e deixa todo mundo dentro de casa. Se tivesse armado, ia pra rua.”

Xinga os governadores do Rio de Janeiro e São Paulo e o prefeito de Manaus, e prossegue: “Como é fácil impor uma ditadura no Brasil. Como é fácil. O povo tá dentro de casa. Por isso que eu quero, ministro da Justiça e ministro da Defesa, que o povo se arme! Que é a garantia que não vai ter um filho da puta aparecer pra impor uma ditadura aqui! Que é fácil impor uma ditadura! Facílimo!”

“Aí, que é a demonstração nossa, eu peço ao Fernando e ao Moro que, por favor, assine essa portaria hoje que eu quero dar um puta de um recado pra esses bosta! Por que que eu tô armando o povo? Porque eu não quero uma ditadura! E não da pra segurar mais! Não é? Não dá pra segurar mais.”

O que está dito resume sim uma confissão criminosa, que enquadra o presidente na Lei de Segurança Nacional (nº 7170, de 14 de dezembro de 1983), sem falar nos crimes de responsabilidade previstos na lei 1.079.

O que esperam os senhores da política e da justiça para apear Bolsonaro do poder? O país está à deriva, o rei está nu e o Brasil contemporiza com uma liderança despreparada, egocêntrica e autoritária que fartamente demonstrou inaptidão para o exercício do mais alto cargo da República.