Ex-governador também questionou,em entrevista, o trabalho do juiz Oudivanil e promotora Aidee Moser.
No domingo de Páscoa fez 1 ano que o ex-governador Daniel Pereira e atual superintendente do Sebrae-RO foi surpreendido pela Polícia Civil e o Ministério Público em sua casa, com mandado de busca e apreensão, vítima da Operação Pau Oco, iniciada em novembro de 2018, quando ocupava o cargo de governador.
Na época, a Polícia Civil informou que Daniel havia sido preso, o que não aconteceu, e os profissionais da imprensa fizeram a correção. O ex-governador, até aquele dia, nada sabia sobre ter sido envolvido “em fatos narrados de forma criminosa” pelo delegado Júlio César, com a suposta acusação de que seria líder de uma organização criminosa.
Na segunda-feira, 13, ao ser entrevistado pelo radialista Fabio Camilo, no Informa na Hora, Daniel Pereira fez relato extenso, detalhando inclusive ações de governo que geraram “desentendimento jurídico” e pressão do segmento de delegados, ilegalidades na Secretaria de Meio Ambiente que vinham de antes da breve gestão de 9 meses, envolvendo pessoas que fizeram acusações sem provas a subordinados seus e lembrou áudios criminosos dos delegados liderados por Júlio Cesar, da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) de Cacoal, revelados pelo jornalista Alessandro Lubiana e entregues ao então presidente do TJ desembargador Walter Waltemberg.
O ex-governador questionou, ainda, a atuação do juiz do caso, Oudivanil de Marins e da promotora de Meio Ambiente, Aidee Moser Torquato.
Veja declarações de Daniel Pereira:
Cidadão e Estado
O cidadão não pode ser vítima do Estado. Os áudios e vídeos que se tornaram público são de agentes públicos cometendo crime com a largura da boca como tem sido feito, aliás, em ações policiais por aí afora. Tentaram construir um projeto de poder dentro da Polícia Civil.
Os delegados foram flagrados em conversas que os criminam, mostrando que manipularam a justiça. Diz um trecho tornado público pelo portal Rondoniagora: “Em tese estamos induzindo o magistrado sobre a existência de uma Orcrim. Esse áudio, de setembro, da data em que ele foi juntado pra frente o que não tinha, já vai perder, inclusive o resultado das buscas, das coisas em relação ao Daniel, porque ele foi usado para incluir o Daniel, inclusive”, revelou um delegado ao interlocutor do áudio atribuído a Júlio Cesar, um dos coordenadores da operação.
As fragilidades do inquérito são gigantes, segundo Daniel, e na conta de nenhum dos acusados nomeados por ele descritos como membros de uma organização criminosa se encontrou indícios de enriquecimento ou obtenção de vantagens ilícitas o que seria provável caso fosse verdade a denúncia.
Sentimento de revolta
Se eu fosse um cara que tivesse cometido um crime eu teria tido medo quando bateram a minha porta. O sentimento é de revolta. Se tem um cara que tem consciência de fazer a coisa correta, e não é de agora, tenho mais de 30 anos de vida pública e onde passei deixei um rastro de trabalho feito e bem realizado, esse cara sou eu. Mantenho a indignação. Passa também a existir o sentimento de medo, porque se eu, ex-governador, sou tratado assim, o que será do cidadão humilde, da zona leste? O que a polícia não pode fazer com esse cidadão?
Três coisas me confortam. Os delegados foram afastados de suas funções; não perderam a função pública porque o delegado-geral, Dr. Samir, é conivente. Foi uma covardia o que fizeram. Depois, a Dra. Aidee (promotora de Meio Ambiente que atuou no caso) poderia ter um final de carreira apoteótico, mas será melancólico. No mínimo ela prevaricou nesse processo, porque não atuou na denúncia feita pelo meu governo que foi o caso da fraude em terras da Fazenda Parati. Depois, o dr. Oudivanil de Marins, neste caso, por sua negligência, ele não tem mais como voltar atrás. Ele foi envolvido de tal maneira que atuou de forma negligente, procrastinando decisões e deixando a assessora dele despachar com promotora e delegado, quando ele deveria estar atento, presente. Ele deixou o pessoal da Pau Oco enrolar e faltou coragem para agir, porque o certo era acabar com o processo. Permitiu que delegados investigassem um govenador do Estado, quando a Constituição diz que somente o STJ pode autorizar. Vão carregar para o resto da sua vida o peso da consciência.
No STJ
De forma estranha agora, ao invés de dar seguimento ao processo, o juiz Oudivanil o remeteu ao STJ. Não temos conhecimento ainda sobre essa decisão, mas para mandar para lá tem que ter autoridade protegida, sigilo de foro especial, que no caso, pela Constituição, indo para o STJ, cabe a desembargadores, governadores e membros do Tribunal de Contas. Até 2019, ao que me consta, nenhuma dessas autoridades estava sendo investigada, e se estava antes, no caso do governador, o desembargador não teria competência aqui e todos os atos tomados por ele seriam nulos. Eu penso que ele inventou esse negócio para se livrar do processo, essa é a verdade dos fatos.
Autonomia para investigar
A Polícia, é claro, tem autonomia no serviço público para investigar o próprio governo a que pertence. Se tivesse agido de forma correta e responsável e não estaria aqui reclamando dos delegados. Fui obtendo informações, e pelos vídeos e áudios eles misturaram as coisas, tentaram construir um projeto de poder dentro da Policia Civil. É um equívoco. A única que é conhecida na humanidade, ou a mais conhecida, era a Gestapo, de Hitler. Deu no que deu. Polícia Civil é a polícia judiciária, atua no MP e no Poder Judiciário, é para fazer justiça. Aplica penalidades, e não atribuir e construir ambientes como se pessoas tivessem cometido crime.
Irresponsável
A atitude da promotora Aidée foi no mínimo irresponsável; eu fiz chegar até ela denúncia de possíveis irregularidades, já existia investigação sobre pessoas da Sedam, mas ela mentiu, se tivesse me dito eu teria afastado os que supostamente estariam envolvidos. Ela tem uma relação muito próxima com o ex-secretário da Sedam, coronel Vilson.
Reprovável
E não teríamos cometido uma injustiça porque até agora não tem provas para apontar o Hamilton Pereira (secretário da Sedam) e o Osvaldo Pitaluga (adjunto) como chefes de quadrilha. Esse grupo de delegados atuou para se firmar pelo poder do medo, e brigaram inclusive com a Draco 1, de Porto Velho. Eles tinham projeto pessoal, de candidaturas a prefeito de Presidente Médici, Ji Paraná e Ouro Preto. É reprovável.
Fragilidades e lambança
O inquérito tem fragilidades. Por isso, todos sabem a atitude da organização criminosa que tomou conta de parte da Polícia Civil. Não sei se o fato de possivelmente eu vir a tentar me reeleger tenha sido potencializado. Atribuíram, a partir de uma informação do COAF (vinculado hoje ao Banco Central), uma quantia de 2 milhões de reais em uma conta do Bradesco de Cujubim a Dayane Valadares, servidora comissionada nomeada por mim, e ela nem mesmo conhece o município. Ela tem conta no Bradesco de Porto Velho. O Ministério Público comprou isso como verdade absoluta e colocou a cidadã em maus lençóis. Só um analfabeto político para fazer uma lambança dessa. Precisava periciar assinatura do secretário Hamilton, por mim nomeado, e isso não foi feito. O Pitaluga sei que age com rigor, e comprou como gerente da Coordenadoria de Unidades de Conservação várias brigas. Ele se negou a regularizar, na gestão da Nanci, e ela concordou com ele, uma propriedade que de manhã tinha 117 hectares e a tarde tinha 117 mil hectares. Já na gestão do secretário Vilson Sales ele resgatou um processo fraudulento, afastou o Pitaluga, alegando incompetência, colocou outro gerente e logo este assinou documento envolvendo 64 mil hectares de uma área fraudulenta. Trata-se da fazenda Parati.
Apartamento quitado
Não temos nenhum centavo irregular. Mas a Jociele Cardoso, nomeada pelo coronel Vilson e que ainda trabalhava no meu governo, quitou um apartamento com salário de R$ 3 a 4 mil. Nenhum servidor consegue reunir quase R$ 90 mil para quitar apartamento financiado em 360 meses. Ninguém está atentando contra a honra de ninguém. É só ver no cartório. Ela deu dois depoimentos à Pau Oco, e não disse em nenhum momento que o Hamilton mandou bloquear qualquer autorização de extração de madeira (ela trabalhava com as Autex) por parte da Alecio Madeiras, de Espigão do Oeste, porque o Ibama informou que ela tinha irregularidades. Vilson, antes, mandou liberar. A única pessoa que tem de explicar a relação com essa empresa é a Jociele Cardoso, denunciada em um email enviado à Ouvidoria do Ministério Público e que nunca foi investigada. Tudo indicando que ela fazia parte de um núcleo bem estruturado na Sedam para cometer ilegalidades. Este email relatava nomes e todos os rolos cometidos no órgão. Os investigadores não encontram nenhum centavo de irregularidade na vida de Hamilton, Pitaluga, Flávio. Josiane tinha participação ativa e deve explicações.
Agenda hostil à Civil
Uma agenda gerou hostilidade ao menos em algum segmento da Polícia Civil. É um modelo de ter duas meias polícias, o Brasil é um dos poucos do mundo. É um modelo ineficiente, porque gera retrabalho por parte da Polícia Civil e Militar. Falo aqui do Boletim de Ocorrência. Com a implantação do Termo Circunstanciado de Ocorrência, TCO, eliminamos isso.
E trabalhamos para melhorar as estruturas científica e tecnológica das instituições. A Polícia Civil faz todos os registros agora de forma digital; uma intervenção da polícia que antes demorava até 2 horas agora um registro de ocorrência sai em 10 minutos.
O TCO é para crimes de menor potencial ofensivo, está previsto em lei federal, somos precursores não só em Rondônia, mas no Brasil, com Santa Catarina e Paraná vindo antes. Isso gerou um entendimento equivocado por parte da categoria dos delegados.
O policial militar vai ver uma briga por exemplo. No local, ele anota tudo, ouve as partes, e pergunta se a pessoa concorda em comparecer em juízo, já manda para a justiça aquela ocorrência. Eu pergunto: para que tirar o policial da rua, ele levar as pessoas envolvidas até a delegacia, perder tempo com isso? Tudo é informatizado, usa uma espécie de tablet. O próprio PM pode fazer para os crimes de menor potencial ofensivo e está fazendo.
Então, por pressão da Civil, o Ministério Público moveu uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade), e eu como governador fiz pessoalmente a defesa e o Tribunal de Justiça entendeu que estávamos corretos. Veja, são 2200 profissionais de segurança pública nas delegacias dos quais 80% eram utilizados para crimes de potencial ofensivo menor. Eles agora otimizam o trabalho, se dedicando aos crimes graves, a desvendar homicídios, tráfico de drogas, sequestros.
Houve um desentendimento jurídico, a prerrogativa do delegado permanece, apenas usamos a energia pública para atingir resultados mais ativos, e não ficar fazendo um trabalho cartorial .