O justo sono na pandemia: senadores trocam de cama e colchão e nós pagamos a conta

Precisou de um eletricista? De um bombeiro hidráulico? De um técnico da operadora de telefonia? O Senado providencia.
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Agência Senado.

Leio no Estado de São Paulo que o Senado Federal, com dinheiro meu, seu e de todos nós, irá trocar camas box e colchões de apartamentos funcionais onde vivem vossas excelências em Brasília. Um pregão eletrônico acontecerá na semana próxima com essa finalidade.

Por ora vossas excelências estão em home office, raramente indo ao local de trabalho, um home office longe da ilha da perversão em que se tornou Brasília de algum tempo, a Brasília, bem entendido, configurada no núcleo de poder constituído pelos pilares do estado moderno, justiça, parlamento e executivo, que no Brasil insiste em se manter como na Monarquia.

Os senadores, que não tem mais títulos honoríficos como no Império, estão em suas bases eleitorais, no nordeste, sudeste, sul, centro oeste ou norte do país. Quando voltarem ao apartamento funcional terão o justo sono pós-pandemia, aquele que reconforta e fortalece os que deram duro para manter vidas a salvo, só que não, pois atestam sem explicação a conduta negacionista e errática na saúde pública adotada pela direção tabajara do país.

Os 81 senadores insistem em viver com regalias vitalícias, algumas delas como o plano de saúde, incluindo toda a família na assistência médica que anualmente dispõe de milhões de reais inacessíveis a muitas prefeituras no Brasil cujo orçamento não alcança cifra parecida para cumprir gastos obrigatórios e fazer algum investimento.

A Associação Contas Abertas revela que em 2017 foram gastos 110,8 milhões de reais em despesas médicas e odontológicas com servidores do Senado, o que inclui senadores, um dado possível para poucos de se acessar, pois não há transparência nenhuma – notas fiscais das despesas não estão disponíveis para o cidadão brasileiro.

Pois bem. Saudáveis com um plano que oferece o tratamento de excelência dos hospitais Albert Einstein e Sirio Libanês, os senadores, boa parte empresários e endinheirados, com salário robusto, vão agora se refestelar em colchões novinhos em folha pagos com o dinheiro do contribuinte.

Fico me perguntando por que eu e você temos de pagar pelo colchão ou cama box do senador. Por que? Que República é esta? Até quando irão abusar da nossa paciência e extorquir todos nós?

Os dez conjuntos de cama box e colchão avaliados em R$ 2,6 mil cada e o mesmo número de colchões a R$ 1,3 mil a unidade serão comprados para substituir os existentes em alguns apartamentos funcionais.

E assim como as mordomias do Supremo Tribunal Federal no campo da alimentação, com lagostas e vinhos de primeira, ou do Exército, com picanhas e cervejas de qualidade, ou da Câmara dos Deputados, que aumentou agora em mais de 100% o valor das despesas médicas que podem ser ressarcidas, as do Senado não podem ser qualquer uma.

Vamos pagar para vossas excelências colchões antialérgicos, antimofos e antiácaros. O colchão box precisa ser “queen size”, ter “mola ensacada com tela de alta resistência”, “tecido jacquard bordado com manta de espuma”, “manta de feltro agulhado”, além de “sistema estabilizador nos cantos e laterais do colchão”. Por aí vai.

E sabe quem mantem os apartamentos funcionais? Nós!  Eles são totalmente mantidos a nossa custa. Você acha que o senador tira dinheiro do bolso para comprar uma fechadura, mandar fazer uma chave? Nada! Nenhum tostão.

Precisou de um eletricista? De um bombeiro hidráulico? De um técnico da operadora de telefonia? O Senado manda, o Senado providencia.

Nós pagamos a conta.  Somos otários, é a grande verdade, numa República de faz de conta.