Eleições 2020: “Partidos devem fortalecer ideologias e se estruturar melhor”

O advogado Juacy Loura Jr. falou sobre mudanças nas eleições de 2020 e disse que "quem não tem redes sociais já está em desvantagem." Foto: Divulgação.

Entrevista Juacy Loura Jr.

Experiente advogado, especialmente no campo eleitoral, com serviços prestados à Justiça Eleitoral de Rondônia como juiz e ouvidor entre 2012 e 2017, Juacy Loura Jr. acaba de apresentar com sucesso à banca da Universidade Nove de Julho (Uninove), por videoconferência, dissertação de mestrado em Direito Constitucional e Eleitoral, mas antes disso conseguiu um tempinho para falar com o Blog da Mara. Ele esclareceu questões sobre as eleições de 2020, como o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, fim das coligações proporcionais e diz que “quem não tem redes sociais já está em desvantagem” se pretende concorrer a vereador e prefeito. A seguir, a entrevista:

Blog da Mara –   A emenda constitucional 97/2017 coloca um fim às coligações proporcionais nas eleições de 2020, estabelece normas de acesso aos recursos do Fundo Partidário e sobre o tempo de propaganda no rádio e na televisão. Quais são os desafios dos partidos com as novas regras?

Juracy Loura Jr. – Com o fim das coligações, os partidos têm de buscar o fortalecimento de suas ideologias partidárias e os eleitores conseguirão mais claramente visualizar o sistema ideológico partidário de cada sigla. Outro ponto é que se evita o famoso candidato “puxador de voto”. Um candidato muito bem votado (geralmente cantor, ator, youtuber ou milionário) na eleição também favorece um menos votado, elegendo candidatos com pouquíssimos votos em detrimento de outros mais bem votados que ficariam de fora. Como exemplo, temos o deputado Éneas Carneiro, Clodovil Ernandes, Tiririca e mais recentemente Janaina Paschoal, em São Paulo, todos puxadores de votos.

As normas de acesso aos recursos (Fundo Partidário e FEFC) e tempo de propaganda estão ligadas ao desempenho do partido nas eleições gerais, ou seja, quanto mais deputados federais o partido eleger mais dinheiro ele terá e mais tempo será destinado na TV.  Lembrando que a mesma EC 97 também instituiu a cláusula de barreira e os partidos devem procurar se estruturar nestas eleições municipais para terem em perspectiva melhor desenvoltura em 2022, e com isso alcançar a cláusula de barreira.

Blog da Mara –  Se o partido não pode mais coligar com outro partido nas eleições para deputado e vereador, o candidato mais votado de um determinado partido garante automaticamente sua vaga na Câmara Municipal?

Juacy Loura Jr. – A sistemática é a mesma quando existiam coligações proporcionais, todavia agora o partido precisa atingir sozinho e não com várias siglas o quociente eleitoral para garantir a vaga e/ou no segundo momento ter acesso a uma vaga pelas sobras. O cálculo do quociente é o número de vagas em disputa dividido pelo número de votos válidos(daí excluindo-se os brancos, os nulos e as abstenções), se o partido atingir aquele total chega também ao quociente partidário e terá uma vaga garantida, cada vez que chegar nesse número ou o mais próximo possível dele, quando se levar em conta a divisão das sobras.

Blog da Mara –  Quais são as regras que devem ser observadas para uso de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC), tratado na Resolução 23605/2019 do TSE?

Juacy Loura Jr. – Muito se tem falado nesse Fundo em momento de coronavírus, muita gente querendo holofote, mas esse valor só existe porque o Judiciário, através do STF, na ADI 4650, proibiu a doação de pessoas jurídicas no Brasil. Sem o dinheiro privado houve sua implementação em 2017 para valer nas eleições de 2018, cujo valor girou em torno de 1,7 bilhão de reais.

Cada diretório nacional de partido político levando em conta o resultado das últimas eleições gerais para a Câmara e Senado receberá de acordo com sua bancada. Por exemplo, o PSL é quem vai receber mais nestas eleições; assim o partido é livre para definir os critérios que serão empregados para distribuir os recursos do FEFC entre seus diretórios estaduais e nos municipais (quem os tiver) e aos seus respectivos candidatos. Mas essa liberdade não é absoluta.

Os critérios a serem fixados pela direção executiva nacional do partido devem prever a obrigação de aplicação do total recebido do FEFC de modo proporcional ao número de candidatas da legenda ou da coligação, observado, em todo caso, o mínimo de 30% da cota de gênero ou de acordo com a ADI 5617(STF) e consulta 6011877(TSE) esse percentual ser igual ao número de mulheres e homens existentes na nominata. Se um partido montar uma lista com 60% de homens e 40% de mulheres, obrigatoriamente 40% do tempo de TV e FEFC deverão ser destinados às candidaturas femininas.

O Fundo Especial de Financiamento de Campanha  visa o equilíbrio dos participantes do pleito. A retirada dele só vai ajudar quem já está em cargo político, tem muita notoriedade ou é muito rico.

Blog da Mara –   Como funciona o autofinanciamento de campanha – quando o candidato investe o próprio recurso – e o que acontece se o candidato ultrapassar o investimento permitido em lei?

Juacy Loura Jr.  – Nas últimas eleições de prefeitos de 2016 e nas eleições gerais de 2018, por uma brecha da lei, os candidatos milionários podiam bancar suas campanhas sozinhos, até o limite imposto pela lei ao cargo disputado. A partir da lei 13.878/2019, o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% do limite previsto de gastos de campanha no cargo em que concorrer. Aqui em Porto Velho, por exemplo, teremos algo em torno de R$ 3 milhões e 100 mil para prefeito, nesse caso o candidato rico poderá se autofinanciar até o limite de R$ 310 mil.

Se ultrapassado o limite, os responsáveis se sujeitarão ao pagamento de multa no valor equivalente a 100% da quantia que exceder o limite, a qual deverá ser recolhida no prazo de cinco dias úteis contados da intimação da decisão judicial. Os responsáveis poderão responder, ainda, por abuso do poder econômico, na forma do artigo 22 da Lei de Inelegibilidades (Lei Complementar nº 64/1990), sem prejuízo de outras sanções cabíveis (Lei nº 9.504/1997, artigo 18-B e 30-A).

Blog da Mara – Quais são as recomendações que o senhor, com sua experiência no Direito Eleitoral, faz aos candidatos que cogitam disputar a eleição, seja para vereador ou para prefeito?

Juacy Loura Jr. – A recomendação é fortalecer as bases partidárias e se mostrar como pré-candidato na forma do artigo 36-A da Lei das Eleições, expondo seu currículo, opiniões e posicionamento político nas redes sociais. Estar atento ao calendário eleitoral e lembrar que as redes sociais serão muito utilizadas nesse processo político, principalmente neste momento de pandemia. Quem não tem redes sociais já está em desvantagem! E óbvio: ter uma assessoria jurídica, contábil e com conhecimento de TI.

Blog da Mara –  O futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Roberto Barroso, disse que até junho se decide sobre o adiamento ou não das eleições, em razão do coronavírus. Algumas vozes já falam em unificar o processo eleitoral municipal com o das eleições gerais de 2022. Como o sr. avalia esse cenário, acredita que as eleições podem ocorrer ainda neste ano?

Juacy Loura Jr. – Sobre adiar as eleições penso que é precipitado imaginarmos nesse momento, ainda que o próprio TSE já esteja avaliando possibilidades. É cedo porque a próxima data importante do calendário eleitoral será do dia 20 de julho a 5 de agosto, prazo das convenções partidárias e porque nossas eleições são no primeiro domingo de outubro(dia 4). As autoridades sanitárias e médicas do país mostram que até lá não estaremos mais com pico da covid-19 e em estado de calamidade. Outro ponto é que os países no mundo que adiaram suas eleições foram no caso da eleição ser em abril e maio como exemplo do Chile e Uruguai, meses em que a pandemia ainda estará no pico e os que terão eleições a partir de outubro permanecem sem alteração como é o caso dos EUA.

Se preciso for, poderá ser adiada para dezembro. Muito antidemocrático e pavoroso é pensar em prorrogar mandatos até 2022 e unificar as eleições municipais com gerais. Essa hipótese atenta contra a cláusula pétrea da Constituição que determina a periodicidade das eleições, só esse argumento é quase intransponível e sem contar que os eleitores votaram em 2016 em vereadores e prefeitos para mandato de 4 anos e não 6, assim qualquer acréscimo se considerado a meu sentir é um ataque a soberania popular e ao princípio democrático. Porque, pensemos juntos, se prorroga-se mandato de prefeitos, por qual razão não prorrogar de presidente para mais 4, 6 ou 8 anos?