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Indígenas fazem denúncias à CPI e pedem expulsão de ONGs de São Gabriel da Cachoeira

Lideranças denunciaram que não sabem como o ISA empregou R$ 12 milhões num suposto projeto de gestão. ONG ganha dinheiro com exportação de pimenta Baniwa.
Senadores Plinio, Bittar e Chico Rodrigues reunidos com lideranças indigenas. Foto: Divulgação/Assessoria.

Lideranças indígenas de São Gabriel da Cachoeira (AM) reunidas com os senadores da CPI das Ongs na quinta-feira, 31, fizeram graves denúncias contra a atuação do Instituto Socioambiental (ISA) e a Federação das Organizações Indígenas do Alto Rio Negro (Foirn). Eles entregaram documentos e cartas e pediram a expulsão definitiva das duas entidades da região.

“Não precisamos mais estar alienados, submissos às ONGs que pertencem a essa região, dizendo que estão fazendo o bem para a população indígena. Em nenhum momento vejo de fato acontecer o bem-estar, o bem-viver e a sustentabilidade pregados há anos, há 36 anos, primeiro pela Funai e depois pelas ONGs. Quando teremos liberdade para ter autonomia, andar com as próprias pernas, deixar de ser pedinte de bolsa família com tanta riqueza, minérios, tudo em nossas terras?” questionou o líder Tukano Lucas Duarte.

Plinio Valério e lideranças que apresentam carta de repúdio e querem ONGs fora da região. Foto: Divulgação/Assessoria.

A diligência da CPI se concentrou no distrito de Pari Cachoeira, e para relatar os problemas enfrentados aos senadores Plínio Valério (PSDB-AM), Márcio Bittar (União Brasil-AC) e Chico Rodrigues (PSB-RR), indígenas chegaram a viajar até 10 horas de rabeta para chegar ao local do encontro.

O líder Silvio Baniwa, por exemplo, viajou com parentes durante 6 dias para fazer coro ao descaso a que estão submetidos os indígenas, e busca por autonomia pelo menos há 30 anos, mas relatam que “são isolados, roubados e tutelados para continuar na miséria pelo ISA, Funai e Forin.”

Plínio Valério disse que denúncias serão apuradas. Foto: Divulgação/Assessoria.

Segundo depoentes, ninguém sabe como foram gastos R$ 12 milhões relacionados a um projeto de gestão administrado pelo ISA, que contou com a consulta de apenas 50 indígenas ligados as duas entidades não governamentais.

Silvio Baniwa disse também desconhecer o que foi feito com R$ 150 mil que teriam sido recebidos pela Associação Indígena do Alto Içana para a construção de galpão para produção de artesanato.

“0 que se sabe é que um balaio (cesto de palha) feito nas comunidades vale uma miséria nas mãos de ONGs que o revendem por um preço exorbitante lá fora,”disse.

Em outra denúncia, feita pelo professor Tuli Melicio da Silva, representante dos Kuripako, o ISA estaria “ganhando muito dinheiro com a venda de uma pimenta” da etnia Baniwa.

“Ganham bom dinheiro em cima do conhecimento dos Baniwa; e para esse povo nada,” completou. A ONG, do mesmo modo que faz com o cogumelo Yanomami, está exportando a pimenta Baniwa produzida por índios para a produção de cerveja na Irlanda.

O senador Plínio Valério, presidente da CPI, disse ser muito grave isso porque a ONG não se apropria apenas do produto, a pimenta, mas também do nome da etnia indígena.

ISA: índio Sendo Assaltado

Em uma carta de repúdio lida pela liderança Baré Jesus dos Santos representando o povo do Alto Rio Negro está o relato de que os indígenas se sentem presos em suas próprias terras.

Ele disse que qualquer projeto para geração de renda ou exploração sustentável tem que passar por consulta prévia do ISA. Para ele, a entidade manipula o povo “dizendo o que pode e não pode fazer;” Jesus pediu a expulsão da entidade. Nesse documento, a liderança rebatizou a ONG de Índio Sendo Assaltado.

“Não existe bem viver para nós enquanto a gente não tem educação, comunicação, internet na escola não tem. É triste, embora tenha chegado tanto dinheiro. O pessoal das ONGs tem salário milionário, casa boa, tudo,” disse a liderança Tukano Armindo Tenório Pena. Jucimara Bosco Brandão disse que a comunidade “nunca viu e nunca vai ver o dinheiro que o ISA recebeu.”

“Fiz uma viagem difícil e demorada para pedir socorro,” começou o relato o indígena Deilton Korupako. “As sedes do ISA e da Foirn ficam em frente à praia, perto da gente. E nunca chegaram lá para nos ajudar. Quem nos dá sustentação é o batalhão e as vezes a prefeitura. Eu queria ter trazido aqui a única coisa que essas entidades deram para a nossa comunidade: uma plaquinha,” disse.

“Não temos escola, energia, gerador, nada,” concluiu.

O senador Plínio Valério disse que a nova coordenadora da Funai na região, Dadá Baniwa, exerceu de “forma sutil” uma pressão sobre as lideranças ao consultar se queriam ou não a presença dos senadores da CPI na região.

“O importante é que recebemos 10 vídeos convidando, e 94 assinaturas confirmando o convite de vocês aqui. É muito empolgante e importante saber que todos que estão aqui não concordam mais em ser tutelados por estas entidades,” disse o senador.

Os três senadores se comprometeram a destinar emendas parlamentares para atender demandas das comunidades do Alto Rio Negro.

São Gabriel da Cachoeira

São Gabriel da Cachoeira, terceiro maior do país em extensão territorial, é o município mais indígena do Brasil. Faz fronteira com a Colômbia e a Venezuela. Segundo o ex-ministro Aldo Rebelo, que lá esteve recentemente, está tomado por estrangeiros, entregue ao narcotráfico e facções criminosas, ao abandono, falta de perspectivas de trabalho e renda.

É a região onde se concentram o maior número de diferentes etnias indígenas do Brasil: os Arapaço, Baniwa, Barasana, Baré, Desana, Hupda, Karapanã, Kubeo, Kuripako, Makuna, Miriti-tapuya, Nadob, Pira-tapuya, Siriano, Tariano, Tukano, Tuyuka, Wanana, Werekena e Yanomami. Nove de cada dez habitantes são indígenas.